«Durante anos, muitos foram os que avisaram que a chamada política de austeridade era incapaz de cumprir o seu objectivo declarado (equilibrar as contas públicas e controlar a dívida pública), e que teria efeitos sociais devastadores, desde logo ao colapsar a Economia enquanto transferia riqueza dos mais pobres para os mais ricos.
(...)
Esta semana foi publicado um interessante estudo em que o sucesso ou insucesso da austeridade foi avaliado para o conjunto da a União Europeia (“Austerity in the Aftermath of the Great Recession” por Christopher House, Linda Tesar e Christïan Proebsting, da Universidade de Michigan).
É uma leitura ao mesmo tempo recomendada e imprópria para os estômagos mais fracos.
Primeiro aspecto, a dívida devia ter descido mas subiu.
Para espanto dos cavaleiros do Excel, cortar de forma cega, abrupta e injusta a despesa pública e fazer o mesmo do lado do aumento de impostos gera um efeito perverso em que a contracção da Economia arrasta o ratio da dívida pública na direcção oposta à pretendida.
Em vez de descer, sobe. Em média, a dívida pública para os Países do Sul (mais Irlanda) subiu o dobro do que teria subido sem as políticas de austeridade focadas no défice de curto prazo a todo o custo. O dobro. Isso enquanto a Economia afundava.
Essa contração da Economia é calculada por House, Tesar e Proebsting, para os mesmos países num total de 18% do PIB entre 2010 e 2014.
Quase um quinto da Economia pura e simplesmente desapareceu. Não admira que o desemprego tenha explodido. Tirando situações de Guerra ou catástrofes naturais é difícil encontrar paralelo na história para um tal descalabro.
Os mesmos autores salientam que essa queda poderia ter sido de apenas 7% se estes países pudessem ter acompanhado a política de austeridade com uma política monetária adequada mas, mais, que se além disso não tivessem aplicado políticas de austeridade, essa queda poderia ter sido de apenas 1%.
Ficam comprovados dois pontos: a arquitectura do Euro não consegue lidar com recessões sem as agravar, factor muito associado a opções políticas erradas e há uma óbvia “self fulfulling prophecy” que diz que se um país não pode desvalorizar a sua moeda isso aumenta o seu risco de incumprimento o que por sua vez gera juros mais altos que mais agravam o risco de incumprimento e assim sucessivamente.
A austeridade não é apenas uma má ideia, cujos fundamentos básicos são destituídos de lógica e cujos efeitos são contrários aos pretendidos, é uma ideia perigosa que agrava desigualdades, cria pobreza e transforma crises financeiras em crises económicas e estas em crises políticas.
(...)»
(Marco Capitão Ferreira: "O balanço da austeridade, agora em números". Na íntegra: aqui. Destaques meus.)
1 comentário:
Só li os destaques...
Conclusões que bem conhecemos empiricamemte e que sentimos na pele...
Quando vamos recuperar o desfalque de milhares jovens licenciados que
partiram e não pensam voltar?
Porém, um artigo muito meritório.
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