domingo, 28 de dezembro de 2014

"Um fracasso monumental e trágico"

«É preciso muita desfaçatez da direita para se apresentar como "salvadora do descalabro financeiro da pátria".


O atual Governo de direita gosta de se apresentar como tendo recebido o país à beira da bancarrota e tendo tido, desde então, de aplicar várias medidas de extraordinária dureza numa espécie de operação patriótica de salvamento do país do colapso financeiro. Todavia, exceção feita à pressão dos mercados de capitais e das agências de rating sobre a dívida portuguesa, do ponto de vista dos fundamentais da economia a situação é hoje muito mais problemática do que em 2011. Mais, para alcançar tais míseros resultados foram cometidos vários atropelos à democracia, à Constituição e aos direitos fundamentais dos cidadãos; e foram alienados muitos recursos estratégicos do país.

Tudo isto torna pertinente e oportuna a questão: para que terão servido tantos sacrifícios e tantos atropelos? Aliás, não há melhor indicador do fracasso monumental que estamos a viver do que o facto de, em ano eleitoral, um Governo de direita se preparar para baixar impostos só às empresas, mas continuando (tudo somado) a aumentar a carga fiscal dos assalariados, pensionistas e consumidores (ver os cálculos do economista Eugénio Rosa a partir dos números do OE), já para não falar na permanência (aqui ou ali suavizada por pressão do TC) das "medidas extraordinárias" (quatro ou cinco anos depois da primeira implementação...). 


Comecemos pelo fracasso nos resultados. Primeiro, temos a cavada e prolongada recessão económica: o PIB estagnou em 2008, 0,0%, decresceu -2,9% em 2009, -1,7% em 2011, -3,2% em 2012, e -1,4% em 2013. Com estas taxas negativas dificilmente a dívida do país é reembolsável e o Estado social é sustentável. Segundo, temos o fortíssimo crescimento do desemprego: 8,5% da população ativa em 2008, 10,6% em 2009, 12,0% em 2010, 12,9% em 2011, 15,7% em 2012, cerca de 16,5% em de 2013. Ou seja, temos aqui um problema social e politicamente intolerável, por um lado, e que coloca uma pressão insustentável nas contas da Segurança Social, por outro. Finalmente, temos a evolução muito preocupante e dificilmente sustentável e reembolsável da dívida pública: 71,7% do PIB em 2008, 83,7% em 2009, 93,5% em 2010, 108,1% em 2011, 123,6% em 2012, e cerca de 129,0% no final de 2013; este ano estima-se que se quede acima dos 130% do PIB. Aliás, como demonstra João Cravinho no seu livro sobre A Dívida Pública Portuguesa – O Manifesto dos 74 e as Propostas Europeias para a Reestruturação (Lx, Lua de Papel) antes da crise e até 2009-2010 Portugal tinha um rácio entre a dívida pública e o PIB praticamente igual à média da zona euro (2008) ou apenas um pouco acima desta (2009 e 2010); desde então a trajetória de divergência é cavadíssima e cifrou-se, em 2013, numa brutal distância: 129%, para Portugal, 92,6%, para a zona euro. E, por outro lado, teve lugar num período em que se cortaram salários e pensões, muito além do previsto (no programa original da troika) e daquilo que tinha sido dito aos eleitores em 2011, e em que se efetuaram extensos programas de privatizações de empresas públicas, muitas delas muito lucrativas para o Estado (CTT, restos da EDP e da Portugal Telecom, etc.). Claro que houve os défices e dívidas mais ou menos inesperados nas empresas públicas e na Região Autónoma da Madeira, mas, mesmo assim…
(...)»
(André Freire. Na íntegra: aqui)

2 comentários:

Majo disse...

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~ Uma análise douta, perspicaz e muito bem elaborada da imensa e devastada ruína em que se tornou Portugal, terra do nosso espanto!

~ As minhas felicitações, Francisco, pela seleção pertinente, em tempo de oportuno balanço.
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Anónimo disse...

Chicamigo

Que espanto!, perdoa-me o quase plágio. Este Senhor di-las das boas; nunca lhe doam as mãos!

Faço meus os parabéns da Zézéamiga (Majo) à cerca da transcrição. Como sempre escolhes muito bem o que publicas.

Oxalá o 2015 que já está mesmo à esquina da cena seja melhor do que o desgraçado 2014. Pior é impossível!

Abç