Pese embora o pouco que sabe, certo é que o negócio da venda do BPN ao BIC, banco de capitais angolanos*, cheira a esturro. Admito que tal seja devido apenas ao facto de que pouco se sabe.
Ora o que se sabe, de acordo com o
comunicado do ministério das Finanças é que a proposta apresentada pelo BIC, prevê "a integração de um mínimo de 750 dos actuais 1.580 colaboradores do BPN", sendo "suportados pelo Estado os custos com a eventual cessação dos vínculos laborais dos trabalhadores das agências e/ou centros de empresa que venham a ser encerrados ou reestruturados num prazo máximo de 120 dias após a data de transmissão das acções."
Sobre o preço diz o comunicado que a "aquisição de 100% das acções do BPN pelo Banco BIC é de 40 milhões de euros, a realizar na data de transmissão das acções. Adicionalmente, caso o banco apresente um resultado acumulado líquido de impostos superior a EUR 60 milhões ao final de 5 anos após a data da transacção, será pago ao vendedor uma percentagem de 20% sobre o respectivo excedente, a título de acréscimo de preço". Mas, previamente à transmissão das acções, o Estado terá ainda de proceder à recapitalização do BPN, com uma entrada de "cerca de 550 milhões de euros".
Perante estes números dir-se-ia que para o BIC este é um autêntico "negócio da China", como já vi escrito por aí. Não subscrevo, com tanta pressa, a afirmação, porque desconheço as contas do BPN. Não posso, no entanto, deixar de notar que no comunicado não se adianta nenhuma explicação plausível para a escolha da proposta do BIC, e é daí que vem o "cheiro a esturro". De facto, para justificar a escolha diz-se apenas que se trata duma "proposta feita por uma instituição de crédito devidamente autorizada e a exercer a sua actividade em Portugal, [que] assegura a continuidade da actividade do BPN e tem em consideração a defesa dos interesses dos depositantes".
Como justificação, a explicação é curta, uma vez que se sabe que, para além da proposta do BIC, havia outras três, figurando entre os proponentes o Montepio Geral que é uma instituição de crédito autorizada e de muito maior dimensão do que o BIC, pelo que o argumento da credibilidade e da confiança que parece transparecer do comunicado do ministério e que tem sido retomado até à exaustão pelo Eng. Mira Amaral em tudo o que é órgão de comunicação social, cai pela base. O argumento da credibilidade pode eventualmente ser válido em relação ao Núcleo Estratégico de Investidores (NEI) outro dos interessados, porque se desconhece a identidade dos proponentes. A sua proposta era, no entanto, bem mais favorável em termos de preço e no concernente à manutenção dos postos de trabalho (que eram assegurados, na íntegra), segundo se lê na comunicação social. Ora, sendo esta proposta bem melhor para o Estado, a ser válido aquele argumento, havia que que demonstrá-lo. E tal demonstração não foi feita.
Pelo que, enquanto não foram dadas a conhecer, em pormenor, todas as propostas, e enquanto não for feita a demonstração de que estamos perante um negócio completamente transparente, o "cheiro a esturro" não passa.
(* Para que não restem dúvidas, devo dizer que a nacionalidade dos capitais do BIC "não me aquenta, nem me arrefenta".)