sábado, 26 de abril de 2014

25 de Abril: 40 anos depois

"(...)
A paz, o pão, a habitação, saúde, educação - todas as reivindicações da canção Liberdade, de Sérgio Godinho, se concretizaram. Tínhamos uma guerra estulta e brutal - 169 mil soldados foram enviados para as colónias, morrendo mais de 8000 - e deixámos de ter. Havia fome - calcula-se que 10% da população portuguesa emigrou nos anos 60, grande parte "a salto", para engrossar bairros de lata nos países de destino - e hoje, persistindo carência, desemprego e exclusão, não há comparação possível. Havia dezenas de milhares de barracas - grande parte das casas eram como barracas - e hoje são uma realidade residual. Havia números de mortalidade infantil africanos, uma rede hospitalar incipiente, e temos hoje um Serviço Nacional de Saúde que ombreia com os melhores e uma mortalidade infantil entre as dez mais baixas do mundo (só entre 1990 e 2011 diminuiu 77%). Em 1970, a taxa de analfabetismo raiava os 30%, hoje é 5%; a taxa de escolarização no secundário era 3,8%, agora é 72,3%; os doutoramentos contavam-se anualmente em dezenas, agora são milhares.
Quem, do PC ao PNR, passando por este Governo de maçães, resume os 40 anos a "desperdício", "corrupção" e "traição" não está bem da cabeça. Outra coisa é dizer que é tudo perfeito, que chegámos ao fim da estrada da canção de Gomes Ferreira (o escritor, não confundir). Aliás, a ideia de que um golpe de Estado nos colocaria, por milagre, na terra do leite e do mel, bastando-nos agradecer a dádiva, comunga da infantilidade amorfa que nos fez, como país, aguentar 48 anos de uma ditadura tacanha. Se há falhanço nestas quatro décadas é esse - o de tanta gente achar que a política é uma coisa que lhe acontece, não algo que se faz. Ter nojo "dos políticos", achando que "são todos iguais", entregando-lhes ao mesmo tempo o destino, é capaz de ser uma grande estupidez - e para isso é que, de certeza, não foi feito o 25 de Abril."
(Fernanda Câncio - "No fim da estrada". Na íntegra: aqui. Realce meu)

2 comentários:

Majo disse...

~
~ Fernanda Câncio tem razão, nem todos os políticos metem nojo, felizmente.

~ Mas presentemente, estamos mal, muito mal, pois todos os que estão a tomar decisões castastróficas; metem-nos nojo, muito nojo.

Anónimo disse...

169 mil Soldados!? sim, sim...percebe mesmo disto a Dótora Fernanda Câncio...