segunda-feira, 9 de março de 2009

De "bestiais" a "bestas" !

É bem verdade: "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades".
Vem isto a propósito dos comentários que a torto e a direito (mais a torto do que a direito) se vão tecendo sobre os empréstimos feitos pela Caixa Geral de Depósitos a alguns accionistas do BCP durante a guerra contra a administração do banco.
Não ouvi, na altura, qualquer crítica sobre a concessão de tais créditos e, no entanto, eles foram falados nos media. Pelo contrário, não faltaram louvores a tais accionistas que, unanimemente, eram considerados pela comunicação social, como excelentes investidores, tendo passado, pelo menos um deles, a ser solicitado para entrevistas em tudo quanto era jornal e televisão. Imagine-se que até de génio financeiro foi apelidado!
Girou a roda da fortuna, as acções caíram aos trambolhões, por razões que são conhecidas e que têm a ver com a crise financeira internacional e os geniais investidores passaram de "bestiais" a bestas: simplesmente, uns especuladores!
A Caixa Geral de Depósitos leva por tabela e aqueles negócios são agora criticados, havendo até quem afirme que foi posta em causa a credibilidade da Caixa.
Com toda a franqueza, não vejo como, nem porquê.
Aparentemente, os negócios em causa não diferem de milhares de outros que a Caixa celebra e, a meu ver, até faziam e fazem todo o sentido. Uma das boas práticas seguidas pelas instituições bancárias consiste na diversificação no que respeita à concessão de crédito, por forma a diminuir os riscos da excessiva concentração num ou em restritos sectores da economia. É dos livros, como qualquer gestor bancário poderá dizer. Ora, é sabido que uma boa parte do crédito concedido pela Caixa se concentra no crédito imobiliário e mais propriamente no crédito à habitação. Era assim e julgo que ainda é. Diversificar o crédito era, pois, uma correcta opção. E não me venham com a conversa de que se tratou de créditos de risco. De risco, como, se havia garantias? É verdade que os bens dados em garantia sofreram, entretanto, forte desvalorização, mas quem é que a adivinhava ? E risco, como, se, afinal, os devedores até tiveram meios para reforçar as garantias?
No meio desta "estória" toda há, no entanto, um aspecto que me não cheira bem: a transferência do presidente da administração da Caixa e de mais dois administradores que transitaram directamente para a administração do BCP. A responsabilidade, porém, cabe por inteiro aos accionistas do BCP, que assim o quiseram, e aos novos administradores, que aceitaram, pelo que uns e outros que se avenham com o cheiro. Não me parece bem, com efeito, mas querendo aqueles e estes, não havia maneira de o evitar. Acho eu.
Para a roda dar a volta completa, agora só falta mesmo é que a anterior administração do BCP, na altura atacada por todos os modos e feitios, (invocando-se, quer as operações com as off-shores, quer as escandalosas remunerações, prémios e regalias) seja elevada aos altares !
Já nada me admira!
Uma nota final para dizer que nem sempre as "boas intenções" dão bons resultados. O questionamento na praça pública (repito, na praça pública) dos negócios da Caixa, por parte dos partidos, por melhor que sejam as suas intenções, pode muito provavelmente vir a revelar-se desastroso para o banco público, pois a Caixa corre, agora sim, o risco de ver boa parte da sua clientela demandar outras paragens. Em boa verdade, pergunta-se, quem é o empresário a quem agrade ver os seus negócios discutidos publicamente? Tirar daqui as devidas ilações até não é difícil.

4 comentários:

Anónimo disse...

Se a CGD é um banco do Estado, não pode ser igual a qualquer banco privado. tem de ter funções e preocupaçãoes que os outros não têm.

Francisco Clamote disse...

Não vejo outra diferença entre a Caixa e qualquer outro banco que não seja o facto de ter o Estado como accionista único e de ter que seguir as orientações do accionista Estado. A Caixa actua em regime de livre concorrência com os bancos privados (e forte concorrência) e, de acordo com os seus estatutos, é uma instituição de crédito como qualquer outra, pois nem sequer já tem os privilégios de que gozou enquanto não foi transformada em sociedade anónima. Os portugueses não a querem assim? Mudem-lhe o estatuto e se, em consequência a Caixa passar a ter prejuízos,(a concorrência não perdoará) os contribuintes aceitarão de bom grado pagá-los ? Não creio.Em última instância, também a podem privatizar ou fechar.
Agora o que não se pode pedir à Caixa é que dê lucros e ao mesmo tempo que não actue como banco que é.
Pergunto ainda: deveria a Caixa abster-se de financiar a aquisição de acções por parte de investidores privados ? A minha resposta é óbvia: não faz nenhum sentido, nas actuais circunstâncias limitar a capacidade da Caixa nesta área ou em qualquer outra no âmbito do negócio bancário.
Isto não significa que a Caixa não deva ter e não tenha outras funções, porque é claro que as tem. Desde logo, sendo um grupo financeiro forte serve para o Estado alavancar muitos investimentos que ao Estado interessa promover ou desenvover e serve também, de alguma maneira, como travão ao aumento dos produtos bancários. Se reparar, a Caixa ainda hoje tem as comissões mais baixas do mercado. E não falo da Cultugest e dos apoios que dá a numerosas instituições culturais e sociais, que disso, melhor saberá a respectiva administração.
Cumprimentos.

Anónimo disse...

Então se é um banco igual aos outros (o k nunca deveria ser e não devia financiar as tais aquisições de acções)porque nos batemos tanto para que seja um banco do Estado?
Só pelos lucros?...
Parece-me pouco.

Francisco Clamote disse...

No meu anterior comentário, já ficaram expressas algumas vantagens em ser um banco público. Não são só os lucros, mas os lucros para o Estado também contam. O facto de o Estado ter um grupo financeiro, permite-lhe ter uma intervenção na economia que de outra forma não teria. Veja-se, por exemplo o caso da intervenção no BPN.
Cumprimentos.