sexta-feira, 23 de julho de 2010

É o "salve-se quem puder"*

Até poderia estar tentado a dar o benefício da dúvida a todos quantos sustentam que a proposta de revisão constitucional em matéria de saúde apresentada pelo PSD, ao prever o desmantelamento do actual sistema público de saúde "tendencialmente gratuito", se funda na necessidade de assegurar a sustentabilidade do sistema e em considerações de justiça social.
A minha boa vontade tropeça, porém, ao verificar, por um lado, que a justiça social pode ser  (e tem sido) assegurada, através da progressividade dos impostos e que o mesmo se pode dizer da sustentabilidade que pode ser (e tem sido) garantida, através do actual nível de fiscalidade e ao constatar, por outro lado, que os factos contradizem as propaladas boas intenções. Com efeito, noto:
a) que aquelas "almas generosas" se contam entre os que se opõem à actualização das taxas moderadoras e entre os que consideram que Portugal tem um nível de fiscalidade muito elevado, o que, a admitir-se, só pode ser verdade em relação aos mais ricos, pois é sabido que existem milhões de portugueses (os mais carenciados) que que não pagam um tostão de imposto sobre o seu rendimento;
b) e que são os mesmos que não aceitam limites à dedução das despesas de saúde, em sede de IRS, limites que afectariam os mais ricos e não os mais pobres, como é evidente.
Tudo leva, pois, a concluir que, afinal, a alegada preocupação com os mais carenciados serve apenas de cortina para encobrir a transformação do actual sistema de saúde baseado na solidariedade entre todos os cidadãos num sistema do "salve-se quem puder" de que sairiam beneficiados todos os que dispusessem de meios (os mais ricos, seguramente) para pagar os cuidados de saúde, mormente os prestados por estabelecimentos privados, e de que sairiam prejudicados todos os demais cidadãos. De facto, assistir-se-ia ou  à degradação dos serviços públicos de saúde, por insuficiência de verbas, ou teriam os menos ricos que suportar um agravamento dos impostos, pois é evidente que a manter-se o abatimento de todas as despesas de saúde, a quebra de receita fiscal proveniente dos mais afortunados seria inevitável.
(* Título reeditado)

1 comentário:

Bettencourt de Lima disse...

Assalto, legitimidade e caudilhos

O PSD de Sá Carneiro, Mota Amaral ,João Jardim, Cavaco Silva e milhares de militantes foi, e momentaneamente ainda é, de matriz social-democrata, como agora se convencionou dizer. Foi envolto nesta matriz que este partido cresceu e se tornou alternativa de governo em Portugal. Assim foi e ainda é. Esta matriz está configurada nos respectivos estatutos. Qualquer militante que se proponha dirigir este grande partido deve, e está obrigado, a se conformar com esta realidade.

Já sofreu fortes ataques no sentido de mudar a raiz social-democrata, mas nunca tão intensos como agora, dirigidos por um grupo que se situa à direita do CDS e pretende tomar por dentro este grande partido e deslocá-lo para a direita liberal.


Para isso terá de mudar os estatutos, submeter a respectiva aprovação aos militantes e denominar o partido de outra forma. Por exemplo, porque não PLD - Partido Democrata Liberal?


Se isto acontecer será legitimo, não será é a mesma coisa.

Bettencourt de Lima