segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Um estágio na Irlanda para Passos Coelho e Paulo Portas e/ou Assunção Cristas

Dado que, após o apuramento dos resultados das eleições legislativas que tiveram lugar em Portugal em Outubro do ano findo, os líderes dos partidos da direita portuguesa (Passos Coelho, pelo lado do PSD, e Paulo Portas e/ou Assunção Cristas, pelo CDS) têm dado abundantes provas de não saberem bem as regras da democracia, parece altamente recomendável para eles, e não menos vantajoso para o país, que tais líderes efectuem um, ainda que breve, estágio na Irlanda para se inteirarem sobre o modo como funciona um regime democrático.
Sugere-se a Irlanda, porque podem optar por um orientador com o qual terão, por certo, alguma afinidade política. Refiro-me a Enda Kenny, actual primeiro-ministro da Irlanda e líder do Fine Gael, que acaba de reconhecer ter sofrido uma derrota, não obstante o seu partido ter sido o mais votado nas eleições que tiveram lugar na passada sexta-feira. Afirmou ele:  "Claramente o Fine Gael e o Labour [partido que juntamente com o Fine Gael  integrava a coligação governamental] não devem ser reconduzidos", afirmação justificada porque, muito simplesmente, os dois partidos da coligação governamental não obtiveram a maioria dos deputados no parlamento irlandês. 
Uma afirmação que os estagiários podem ir mastigando durante a viagem para não fazerem figura de completos ignorantes na matéria. É que a afirmação mais não é que a expressão da regra basilar da democracia: governa quem tiver o apoio da maioria parlamentar
É uma regra simples, mas que, de facto,  não é ainda conhecida por nenhum dos futuros estagiários, ponto que até nem sofre contestação, visto que qualquer deles tem feito questão de, por palavras e actos, não permitir que haja dúvidas sobre esse particular.
(Na imagem, Enda Kenny. Imagem e notícia no Negócios)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

"Abstenção burra"

«O PSD votou contra o Orçamento do Estado de 2016 na generalidade. Na votação final fará o mesmo. Mas entretanto para a especialidade, quando o OE se discute artigo a artigo, decidiu duas coisas: primeira, não apresentará nenhuma proposta de alteração; segunda, abster-se-á face a todas as propostas de alteração que forem apresentadas venham da esquerda ou da direita.

Argumento do PSD para se abster sempre: assim o PS, se quiser que propostas à sua esquerda sejam chumbadas, terá mesmo de votar contra essas propostas. Não poderá apenas abster-se contando com um voto contra do PSD para as chumbar. Isto supostamente criará problemas dentro da "geringonça", acha o PSD.

(...)[ Só que] abstendo-se o PSD ou não se abstendo, isso nunca irá retirar ao PS o ónus de ser ele a chumbar propostas vindas da sua esquerda. O resultado final será sempre o mesmo. O PS, porque está no meio da balança, é que decide para que lado esta se inclina. E isto não é só política. É aritmética também - e da mais simples. E sendo também aritmética menos se percebe esta decisão do PSD. Parece que não sabe somar 2+2.

Já conhecíamos a "abstenção violenta" do PS de António José Seguro no primeiro Orçamento de Passos Coelho, em 2011.(...)

Agora, porém, temos outra abstenção, que é a abstenção burra: a abstenção de quem não sabe aritmética simples; a abstenção de quem não consegue propor uma agenda política alternativa apresentando alterações ao Orçamento do Estado; a abstenção de quem é muito contra o OE mas depois não tem posição quando os artigos se vão discutindo.»
(João Pedro Henriques: "Da abstenção violenta à abstenção burra" Na íntegra: aqui. Destaque meu)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Novo Banco: um "BES bom"...

...a perder dinheiro. 
Restam hoje poucas dúvidas de que fazer pior do que o trio responsável pela resolução do caso BES, formado pelo (felizmente) ex-primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, pela (graças a zeus) ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque e pelo (lamentavelmente ainda) governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, não teria sido tarefa fácil. Para não dizer que teria sido impossível.
De dois primeiro já nos vimos livres. O terceiro, se fosse capaz de ter um lampejo de lucidez, já, há muito, que teria embalado a troixa.

(Notícia e imagem daqui)

Coisas & loisas #4


(pelourinho)

(igreja matriz)

(rua pedonal no centro da cidade)

(conjunto escultórico numa praça no centro da cidade)

(reprodução de uma gravura rupestre do Vale do Côa)

O genuflexório com sinais de uso

«Podem acusar o Orçamento do Estado (OE) para 2016 de fazer figas para que tudo corra bem, como se revelasse uma fé inquebrantável em Deus (sendo que o Senhor nem voltou à terra, nem consta que frequente os mercados). Mas há algo que este OE faz e faz bem: deixou de fazer mal às pessoas por antecipação. Incorpora fé, sim, mas também opções orçamentais que visam a progressiva reposição de direitos que, durante anos, foram retirados enquanto alguns comemoravam com champanhe: cada vez que a troika simulava a saída, ia-se cravando mais fundo nos bolsos dos mais desfavorecidos, pela porta dos fundos das opções de Passos e Portas. Fruto dos acordos parlamentares com o BE e o PCP, a histórica aprovação deste plano orçamental é o primeiro capítulo de uma não capitulação ou rendição total a Bruxelas, saindo do pensamento da inevitabilidade do empobrecimento dos mesmos, dos cortes de salários e das pensões, cumprindo a Constituição. Pela primeira vez em muitos anos, a sensação de nos termos levantado do banquinho com encosto sobre o qual as pessoas se ajoelham para rezar. Esse mesmo, o genuflexório.(...)»

(Miguel Guedes:"A voz maviosa e o genuflexório"

(Vale mesmo a pena ler. Na íntegra. Aqui. Destaques meus)
(Imagem da web)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Boa pergunta e melhor resposta

:
A pergunta:
Este não é o nosso Orçamento. (...)Mas que Orçamento estaríamos aqui a debater neste momento se a maioria do nosso povo não tivesse lutado durante quatro anos e com o seu voto não tivesse decidido alterar a composição da Assembleia da República ?
 A resposta: 
Um novo orçamento da responsabilidade da coligação de direita “Só ia aumentar o sofrimento da maioria dos portugueses, como fizeram todos os orçamentos do Governo PSD/CDS”.
(Autor da pergunta e da resposta: Jerónimo de Sousa)
(citações e imagem do Expresso)

"Homo genuflexus"

«Pedro Passos Coelho, depois de ter sido durante quatro anos no governo um exemplar Homo genuflexus, apresenta-se agora na oposição como modelo do Homo firmus e erectus na relação com Bruxelas. É verdade que para usar na lapela o verbo "social-democracia sempre" tem de apagar do cadastro as máculas neoliberais - não vale a pena negar o óbvio, aquilo que se fez no Portugal do ajustamento foi privatizar a eito, cortar despesa pública para reforço do setor privado, aumentar impostos à bruta e desregulamentar o mercado de trabalho para facilitar o capitalismo selvagem - que lhe iluminaram o caminho da governação. Mas, mesmo na retórica de campanha eleitoral, exige-se decoro. Se António Costa "ajoelhou" perante a Comissão Europeia veremos mais adiante. É verdade que a austeridade não acabou e, como diz Passos Coelho com razão, foi rebatizada, com o Orçamento a passar de austeritário a restritivo. Como já aqui disse, a austeridade de direita foi substituída pela da esquerda. De uma a outra, venha o diabo, mas esta é seguramente mais equitativa e, por isso, mais justa do ponto de vista social já que não recai sobre os rendimentos do trabalho e, pelo menos, impõe aos habituais isentos de esforço a obrigação de contribuírem para a comunidade. Mas, pelas almas, que autoridade tem o anterior primeiro-ministro para encher a boca com tais denúncias? Seguramente que nem os seus acólitos mais entusiastas se esquecem das idas regulares à chancelaria alemã para fazer provas de diligência e promessas de ir além da troika à senhora Merkel. Ou das imagens recorrentes da subserviência de Vítor Gaspar em Bruxelas perante o poderoso senhor Schäuble. Ou mesmo da exibição de Maria Luís Albuquerque em Berlim, em vésperas de eleições, como modelo de aluna bem-comportada. Ajoelhar é isto. Aceitar tudo sem questionar ou sequer tentar negociar. Aquilo que o atual governo fez foi, apesar de tudo, diferente. Negociou, cedeu como é próprio destes processos, e, como escrevia Freitas do Amaral nesta semana na Visão, conseguiu na Comissão Europeia e no Eurogrupo a aprovação de um Orçamento social e não neoliberal, o primeiro desde a criação do euro. De Passos Coelho aquilo que temos para recordar são anos a fio a genufletir e a resignar, por opção ideológica, em nome de uma saída limpa que, confirmamos hoje, está crivada de nódoas.»
(Nuno Saraiva:"E por falar em ajoelhar"

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Mas o que vem a ser isto?

"Cavaco Silva irá presidir a uma reunião do Conselho de Ministros a convite de António Costa. (...) O chefe de Estado marcará presença na última reunião antes cessar o seu mandato, a 3 de março, ou seja, seis dias antes de Marcelo Rebelo de Sousa assumir as funções como Presidente da República."

Ou Costa, ou Cavaco, um deles está com a memória fraca. Ou,  porventura, os dois.
(Citação e imagem do Expresso)

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

A hipocrisia em alta

«Se por estes dias os mercados têm estado altamente instáveis e em baixa, em contrapartida a hipocrisia política tem estado em alta. Um alemão, um holandês, um irlandês e um português, todos com elevadas responsabilidades, são a prova disso.

O alemão chama-se Wolfgang Schauble, é ministro das Finanças e a personalidade que verdadeiramente manda no Eurogrupo com mão de ferro. Na última semana, Schauble entendeu pronunciar-se duas vezes sobre a situação portuguesa. Num dia afirmou que “Portugal deve estar ciente de que pode perturbar os mercados financeiros se der impressão de que está a inverter o caminho que tem percorrido. O que será muito delicado e perigoso para Portugal”. No dia seguinte voltou à carga: “Portugal tem de fazer tudo para responder à incerteza nos mercados financeiros”. E acrescentou que Portugal ainda não tem “resiliência”.

Ora Portugal não terá resiliência e pode estar a inverter (pouquinho) o caminho austeritário que vinha trilhando. Agora imputar responsabilidades a Portugal pela perturbação dos mercados financeiros parece um bocadinho exagerado, sobretudo quando o maior e mais importante banco alemão, o Deutsch Bank, está no centro de uma brutal crise, que levou a que as suas ações perdessem 50% do seu valor entre agosto de 2015 e a atualidade; que existam sérios rumores de que o banco está com dificuldades em pagar os cupões de obrigações contingentes convertíveis; que tenha registado prejuízos de 6,8 mil milhões em 2015, o que não acontecia desde 2008; que tenha 1,2 mil milhões em ações de litigância no ano passado e que isso vá continuar por estar acusado de envolvimento na manipulação da taxa Libor e de suspeitas de fuga ao fisco; e de não estar a gerar resultados para pagar dividendos.

Sobre este “pequeno” problema, Wolgfang Sachauble disse simplesmente: “Não, não tenho receios em torno do Deutsch Bank”. Não, verdadeiramente o problema dos mercados e de Schauble é Portugal – e não um banco alemão que tem um papel central na Alemanha, a economia mais poderosa da zona euro, tão central que não existe comparação a nível mundial.

Provavelmente há uma relação umbilical: com mercados em baixa, a hipocrisia política está em alta. Quatro exemplos: Wolfgang Schauble, Jeroen Dijsselbloem, Enda Kelly e Pedro Passos Coelho

O holandês chama-se Jeroen Dijsselbloem, é ministro das Finanças do seu país e presidente do Eurogrupo. Consta que é socialista, mas disfarça bastante bem. Tem sido dos mais duros com os países do sul, em particular com a Grécia e agora com Portugal. É dos que mais combate a ideia de que possa haver uma alternativa à receita seguida de cortes em salários, pensões e no Estado social para enfrentar a crise. E no entanto, Jeroen, tão implacável com os mais fracos, tem prosseguido de forma metódica a consolidação da Holanda como um paraíso fiscal, onde estabelecem a sua sede fictícia as empresas dos países periféricos para aí pagarem impostos muito reduzidos dos lucros que obtêm nos seus mercados de origem, enfraquecendo ainda mais, do ponto de vista da receita fiscal, esses países. Mas sobre isto, não se ouve um pio do histérico Jeroen.

O irlandês chama-se Enda Kelly, é o atual primeiro-ministro, e está em plena campanha eleitoral, liderando uma aliança entre o Fine Gael e o Partido Trabalhista. O problema de Kelly é que as intenções de voto na sua coligação andam na casa dos 36%, longe dos 44% necessários para obter uma maioria absoluta. Kelly teme assim o que aconteceu em Portugal e está a acontecer em Espanha, no que toca às soluções governativas pós-eleitorais. E vai daí nada melhor do que apontar o dedo para aqui, gritar que somos um mau exemplo e que Portugal está a pagar um preço elevado – que classificou como “horrendo” – devido à instabilidade política que se terá instalado no país na sequência das eleições de outubro passado. “Não queremos ser como Portugal”, afirmou. E, claro, a luta é entre a estabilidade (Kelly) ou o caos (a oposição). A solidariedade europeia é desvanecedora.

Finalmente, por cá há um patriota a quem a possibilidade de investidores chineses entrarem no capital da TAP está a incomodar fortemente. Chama-se Pedro Passos Coelho e afirma: “não sabemos de que maneira é que o interesse público está definido e defendido.” Por acaso este Pedro Passos Coelho é o mesmo que foi primeiro-ministro de Portugal entre 2011 e 2015. Por acaso foi durante o seu consulado que a empresa pública chinesa China Three Gorges se tornou o maior acionista da EDP; que a chinesa State Grid se tornou, com 25% das ações, a maior acionista da REN – Rede Elétrica Nacional; que o grupo chinês Haitong comprou o BESI; que o grupo privado (?) chinês Fosun comprou a Fidelidade e a BES Saúde, hoje Luz Saúde…

Felizmente, nessa altura, Passos Coelho sabia muitíssimo bem de que maneira é que o interesse público estava definido e defendido. É uma pena que não tenha decidido partilhar essa definição e essa defesa com os seus concidadãos. Mas, claro, este caso da TAP é gravíssimo.
(...)»
(Nicolau Santos: "Da hipocrisia na política europeia e portuguesa", in Expresso de 15/02/2016. Destaque meu. Via)

Coelho não gosta?

É bom sinal.

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Passos (de) um oportunista

«(...)
Serei o último a ser surpreendido pela versão actual do Passos “social-democrata”. Nos últimos anos, na Quadratura do Círculo, muitas vezes um ponto de discordância entre mim e António Costa era a classificação ideológica de Passos Coelho. Costa insistia sempre que Passos era um “neo-liberal”, a que acrescentava que “não escondeu isso nunca”, e eu tinha muitas reticências com essa classificação, que era um upgrade ideológico de um político essencialmente pragmático, num sentido político não pejorativo, “oportunista”.

Eu já tinha conhecido várias encarnações ideológicas de Passos, em função do seu posicionamento no interior e no exterior do PSD. Posso admitir que no exercício da sua função de primeiro-ministro, tenha interiorizado com mais profundidade a ideologia da troika, com quem se sentia muito à vontade, e cujos “arredores” em termos de ideias sobre o homem, a sociedade e a economia, incorporou com grande à-vontade no seu discurso. E se há coisa que não foi nestes últimos anos foi social-democrata; foi, antes, em muitas declarações e posições, anti-social-democrata. E mais, essas declarações nunca a troika lhe pediu para fazer.

Isto torna politicamente absurda mais esta viragem, mas ela é coerente com o seu lado “oportunista”. Ele e parte dos seus – não todos, porque alguns são mesmo anti-sociais-democratas – fazem política pelos jornais e pela comunicação social e, como hoje, estão todos os dias a ler que o PSD perdeu o “centro” e se “radicalizou à direita”, coisa que não admitiam há dias, toca de virarem sociais-democratas.

Claro que um Passos social-democrata sem aspas a primeira coisa que faria era criticar duramente o Passos dos últimos quatro anos, e isso parece-me muito pouco provável. Por isso vamos ter outra reviravolta política só de nome, sem substância nem qualidade

(José Pacheco Pereira: "Nem quente nem frio", in Revista Sábado, 12/02/2016. Via)

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Que desilusão !

A agência canadiana de notação financeira DBRS, contrariando as previsões (e os desejos) das vozes da direita portuguesa que fazem coro quase unânime nos media nacionais, afirma que vai manter a notação "BBB" atribuída a Portugal (fonte). 
Alinhado com o coro, Passos Coelho, durante o debate quinzenal na Assembleia da República, já dava como certa a necessidade de um plano B "para acudir à situação orçamental", como se os seus desejos já se tivessem tornado realidade.
Contrariado no seus desejos pela decisão da agência de rating, o recém convertido à "Social-democracia, sempre!" lá terá que encaixar mais esta desilusão.  
Pela minha parte, só espero que não seja a última.
(A imagem do recém convertido é do "Expresso")

Mistérios...



Mistérios? Nesta sondagem há vários.
(Sondagem e imagem do "Expresso")

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Ora então, tomem lá!

Os Orçamentos de Estado são, por definição, documentos de "toma lá, dá cá", já que não passam de instrumentos de previsão de receitas que o Estado haverá de cobrar e de despesas que ao Estado cumpre satisfazer. A expressão "toma lá, dá cá" usada pelos partidos da direita (PSD e CDS) como fórmula de crítica ao Orçamento de Estado para 2016 apresentado pelo Governo PS é, pois, perfeitamente inútil.
Em todo o caso, se quisermos dar alguma utilidade àquela expressão, teremos de concluir, acompanhando o que escreve Rafael Barbosa, que estamos perante «um "toma lá, dá cá" que obedece a uma lógica de redistribuição de rendimentos mais equilibrada do que a receita aplicada pelo Governo anterior que, convém não esquecer, aplicou a austeridade com convicção e mentiu sem pudor (por exemplo, o engodo da devolução da sobretaxa)
E, já agora, secundemos o que, na sequência, o mesmo autor escreve: 
«Se os rendimentos do trabalho continuam a ser taxados a níveis exorbitantes, é a Passos e Portas que é preciso apontar o dedo. Foram eles que decidiram o "brutal" aumento de impostos que continuamos a pagar. Se Bruxelas se habituou a uma obediência cega aos tratados e às suas interpretações, foi porque os líderes de PSD e CDS preferiram a postura do "bom aluno" ao de defensores do povo que os elegeu. Supor que, com este primeiro Orçamento, ascenderíamos das trevas para a terra do leite e do mel é coisa para crentes desmiolados.»
Aldrabões e desmiolados. É isso mesmo. Gostaram?


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Aumento de impostos: sim ou não?


«Está tudo muito impressionado porque – dizem-nos – vai haver aí um aumento de impostos. Sim ou não? Bom, vamos por partes.

Em primeiro lugar, podem os portugueses estar descansados, não vem aí nem nada que se pareça com o aumento de 3.000 milhões de euros no IRS cobrado a quem ainda conseguiu manter o seu trabalho para Vítor Gaspar poder tapar em 2012, e anos seguintes, o brutal dano causado à economia portuguesa pela peregrina ideia de aplicar mais austeridade e mais depressa.

Em segundo lugar, podem estar descansados que o tempo em que se aumentava o imposto sobre o salário para baixar o imposto sobre os lucros das empresas também termina este ano (embora alguns dos efeitos da descida de 2015 ainda se façam sentir). Como termina aquela maneira de calcular a dedução dos encargos com os filhos que privilegiava quem ganhava mais. Sim, leram bem, quem ganhava mais. 

Em terceiro lugar, vamos a contas: só a sobretaxa de IRS diminui 430 milhões de euros, que passam a ficar nos bolsos de quem trabalha. É pena não poder ser mais, mas sempre são 430 milhões mais do que a promessa feita pelo PSD e CDS em campanha teria na realidade dado, e que sabemos hoje (e já desconfiávamos na altura) é um redondo zero. Ia haver, isso sim, mais uma baixa do imposto sobre lucros. Essa não falharia de certeza.

Então mas não aumentam vários outros impostos? Bom, quarto lugar, sim. Fruto de opções do Governo e das negociações com Bruxelas alguns impostos especais sobre o consumo sofrem algum agravamento.

Mas esse agravamento é muito menor do que à primeira vista parece. Desde logo, parte do aumento de receita desses impostos não vem do aumento do que pagamos, vem do facto de irmos parar de asfixiar a Economia com cortes brutais e cegos que custaram ao País muitas dezenas de milhares de milhões de euros de riqueza que ficou por produzir. Parte dessa riqueza começará a voltar a ser produzida e, só por isso, o total de imposto cobrado aumenta, mas sem que isso signifique aumento da respectiva taxa.

Depois, com a excepção do ISP (já lá vamos) o agravamento em causa não é, todo junto, maior do que o valor só da devolução da sobretaxa e incide sobre consumos específicos, como os maços de tabaco (fumador me confesso, mais 7 cêntimos é bem menos do que tenho visto aumentar o preço nos últimos anos) e álcool, que são um consumo facultativo, os carros novos (ora quem pode pagar um carro novo poderá também pagar um pouco mais por ele) e o crédito ao consumo, o que é uma medida que se destina a impedir que as famílias se endividem demasiado junto da Banca para depois ainda ouvirem políticos como Passos Coelho dizerem-lhes que a culpa da crise é delas porque viveram acima das suas possibilidades.

Ou seja, para a esmagadora maioria dos portugueses que mais precisam de proteção, e ao contrário do que acontece com a devolução dos 430 milhões de euros de sobretaxa, que é feita a eles primeiro, estes aumentos, ainda assim relativamente pequenos, não lhes pesarão no bolso. Se isto não é cuidar de quem precisa, não sei o que seja.

Já o aumento do ISP é feito dentro de um contexto de baixa do preço do petróleo que tem de ser considerado antes de nos pormos a falar de efeitos perversos na Economia portuguesa.

É que em 2012, por exemplo, o preço da gasolina estava mais elevado do que ficará agora na sequência do imposto e não foi por isso que morreu alguém. Por mim, entre pagar 1,6 euros para os bolsos sei lá de quem e pagar agora 1,4 euros sabendo que 0,07 euros (sim, é esse o aumento expectável) permitem ajudar quem mais precisa sei o que prefiro. Eu ainda estou a pagar menos, essa é que é a realidade.

Tudo visto e ponderado, o que este OE nos diz, do lado fiscal, é que trocamos uma política de tirar salários às pessoas para baixar impostos às empresas por uma política fiscal que devolve rendimentos às pessoas, começando pelas que menos têm, optando por tributar alguns consumos com os quais a maioria dos portugueses pode apenas sonhar (como o de comprar carro novo) ou em níveis que são, ainda assim, conducentes a preços mais baixos do que os que tivemos de pagar num passado recente.

Gostaria de ver um OE que pudesse fazer a devolução de rendimentos sem penalizar estes consumos de tabaco, álcool e com carros? Se calhar gostava, mas se a política é a arte de fazer escolhas difíceis neste caso nem precisamos de tanto. A escolha é fácil: repor rendimento aos novos pobres criados pela crise em que estivemos mergulhados deve vir antes de tudo o resto


(Marco Capitão Ferreira: "Aumento de impostos é com quem diz". Hoje na edição impressa do Público  e no Público on line só para assinantes)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

"Afinal foi boa ideia mudar de Governo"!

«(...)

Um dos compromissos políticos do PS, convém recordar, era ter uma atitude mais enérgica na defesa do interesse nacional junto da UE. Nada de novo: é assim que os outros países fazem há muito tempo, num esforço permanente de negociação e compromisso. 

Foi exactamente assim que França, Itália e Áustria, por exemplo, negociaram, com pequenas concessões, os seus orçamentos e é assim que o Reino Unido está neste momento a negociar todo um caderno reivindicativo, tendo em vista o referendo sobre a sua permanência na própria UE. É claro, era outra a famigerada cultura do “bom aluno” alimentada pelo governo PSD/CDS: “Se eles, que até falam estrangeiro, mandam, a nossa obrigação de país humilde, pobre e pequeno, é obedecer”. Esta atitude submissa e subserviente foi cumprida com tamanho excesso de zelo que Passos e Portas chegaram ao ponto de perfilhar, por incrível que pareça, uma assumida estratégia de empobrecimento do país e fizeram até questão de ir “além da ‘troika’”, aplicando o dobro da austeridade que estava prevista no memorando inicial.

Os resultados são conhecidos: três anos consecutivos de recessão, níveis nunca vistos de desemprego, vagas de emigração em massa, queda abrupta da natalidade, derrocada ou venda ao desbarato dos activos estratégicos nacionais e, não obstante toda a austeridade, falhanço absoluto nas metas do défice e aumento exponencial da dívida pública. Foi por todas estas excelentes razões que a maioria dos portugueses votou por uma mudança de política.

Não seria de esperar, evidentemente, que uma inflexão importante na política de austeridade pudesse acontecer sem alguma resistência de Bruxelas, onde há muita gente que olha para Portugal a pensar em Espanha e ainda prevalece, apesar dos sinais de maior flexibilidade, a doutrina austeritária. Todavia, com cedências de parte a parte, a aproximação de posições, embora não sendo total (nem isso seria de esperar), permite perspectivar um OE para 2016 capaz de cumprir integralmente o triplo objectivo nuclear da política económica do Governo socialista e da maioria de esquerda: aumentar os rendimentos das famílias, pôr fim ao ciclo de empobrecimento e estimular o crescimento da economia e do emprego.

Tudo isto, obviamente, aflige a direita - e, pelos vistos, não é pouco. Afinal, entre o défice mirabolante de 1,8% que Passos e Portas pretendiam atingir em 2016 (e que inscreveram no PEC enviado para Bruxelas em Abril) e os 2,4% que António Costa agora negociou com a Comissão Europeia há uma diferença enorme de 0,6 p.p. do PIB. Ou seja, os portugueses vão sofrer menos mil milhões de euros de austeridade do que queriam PSD e CDS! De uma assentada, ficarão assim à vista três verdades, todas elas muito importantes, mas também muito inconvenientes para a direita: primeiro, sempre vale a pena “bater o pé” em Bruxelas para defender o interesse nacional; segundo, é possível pagar salários e pensões por inteiro, repor os apoios sociais, eliminar a sobretaxa e até aumentar o salário mínimo em concertação social; terceiro, afinal foi boa ideia mudar de Governo.»
(Pedro Silva Pereira: "Bater o pé". Na íntegra: aqui. Destaque meu)
(Imagem do Económico)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

"Passava lá ele, o Orçamento!"

«(...)
O orçamentista fartou-se de grasnar, este ano. Que não dava. Passava lá ele, o Orçamento! Bruxelas é que lhe ia cortar o pio, à geringonça... A piadeira, com o aproximar do Carnaval, travestiu-se de abutre. O velho abutre de Sophia, que "alisa as suas penas/ A podridão lhe agrada e os seus discursos/ Têm o dom de tornar as almas mais pequenas." O gozo que daria aos orçamentistas que Bruxelas nos fizesse mais pequenos.
Olha, parece que não. Bruxelas faz o seu papel, Portugal faz o seu papel. Até aqui, 50 por cento do que costumava acontecer. Desta vez, estando ambos a cumprir - uma, lá, para cortar, outro, cá, para não deixar ser cortado -, parece que vai chegar-se a acordo, que é o que costuma acontecer a negócios entre iguais. Só cede quem negoceia; só consegue quem tenta. Quem, como antes, ia mais além contra si próprio, era recebido de braços abertos em Bruxelas. Pudera...»
(Ferreira Fernandes: "Passarinhos e passarões, aves de rapina e cucos". Na íntegra: aqui)