A obsessão conduz sempre a opções e soluções que tenderão a ser irracionais. A obsessão pela austeridade "custe o que custar" e pelos cortes indiscriminados na despesa por parte do actual governo não foge à regra. Veja-se, a titulo de ilustração, o caso relatado por
Manuela Ferreira Leite, nem mais menos que a anterior líder do PSD, num texto com o título "O PREÇO DE POUPAR" publicado na última edição do "Expresso" (3ª página do Caderno de Economia) parcialmente reproduzido aqui, onde o repesquei.
De algum modo, este caso vem dar consistência à denúncia de Correia de Campos (a que me refiro no "post" anterior) de que este governo toma as decisões sem curar de saber qual o rácio custo/benefício das suas opções.
Está encontrada a explicação para o facto: quando se percorre o caminho da irracionalidade o conceito deixa, na verdade, de fazer sentido.
"É preciso que se avaliem os efeitos de tais reduções para que as “emendas não sejam piores do que os sonetos”.
Vem isto a propósito de uma recente notícia sobre o encerramento de uma loja do cidadão – a dos Restauradores – e a sua mudança para outro local.
Segundo o relato, o motivo de tal deslocação relaciona-se com o elevado preço da renda anual paga pelas atuais instalações – “objetivo poupança” – e ainda pelo facto de esta ser a loja com mais queixas dos cidadãos.
Impressionou-me a leveza do conceito de poupança associado a esta decisão, mas não o epíteto de “loja com maior número de queixas”, uma vez que se trata de uma decorrência normal de ser, de longe, a loja com maior número de utentes do país.
E esse número de utentes decorre precisamente da sua localização – no centro de todos os meios de transporte – o que implica um espaço compatível com a dimensão da procura. Daí a renda, eventualmente, elevada.
Para avaliar a poupança decorrente da deslocalização anunciada, ter-se-ia de considerar a destruição do investimento feito naquelas instalações, investimento que não é transferível para outro local porque não se trata de móveis, mas por ex: infraestruturas elétricas e informáticas complexas que vão ter de ser feitas de novo nas futuras instalações.
Mas, segundo as notícias, o que se vai oferecer aos cidadãos não será o mesmo serviço que se oferecia nos Restauradores.
É uma instalação dez vezes menor do que a atual, suficiente para um serviço de 2ª geração, ou seja, um atendimento pouco pessoalizado e muito informatizado, dirigido a quem lida bem com as novas tecnologias, que trata dos assuntos via internet em vez de ir para as filas das lojas do cidadão e que não representa mais do que 30% da população.
Os restantes 70% vão perder o serviço que tanto procuravam.
Não se está, portanto, perante uma poupança porque esta só tem lugar se o mesmo serviço for prestado por um custo inferior ou se for eliminado por ser supérfluo.
Neste caso, a poupança passaria por uma renegociação da renda, possível com um senhorio em perspetiva de perder o inquilino.
Tudo o resto é prejuízo para o Estado."
1 comentário:
Caro Francisco,
Fez bem em registar aqui, para a posteridade, as palavras da Ferreira Leite. É um sinal de que os "social-democratas" estão em desacordo com os neoliberais do PSD.
Um abraço.
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