domingo, 19 de agosto de 2012

A irracionalidade no posto de comando

A obsessão conduz sempre a opções e soluções que tenderão a ser irracionais. A obsessão pela austeridade "custe o que custar" e pelos cortes indiscriminados na despesa por parte do actual governo não foge à regra. Veja-se, a titulo de ilustração, o caso relatado por  Manuela Ferreira Leite, nem mais menos que a anterior líder do PSD, num texto com o título "O PREÇO DE POUPAR" publicado na última edição do "Expresso" (3ª página do Caderno de Economia) parcialmente reproduzido  aqui, onde o repesquei. 
De algum modo, este caso vem dar consistência à denúncia de Correia de Campos (a que me refiro no "post" anterior) de que este governo toma as decisões sem curar de saber qual o rácio custo/benefício das suas opções. 
Está encontrada a explicação para o facto: quando se percorre o caminho da irracionalidade o conceito deixa, na verdade, de fazer sentido. 

"É preciso que se avaliem os efeitos de tais reduções para que as “emendas não sejam piores do que os sonetos”. 
Vem isto a propósito de uma recente notícia sobre o encerramento de uma loja do cidadão – a dos Restauradores – e a sua mudança para outro local. 
Segundo o relato, o motivo de tal deslocação relaciona-se com o elevado preço da renda anual paga pelas atuais instalações – “objetivo poupança” – e ainda pelo facto de esta ser a loja com mais queixas dos cidadãos. 
Impressionou-me a leveza do conceito de poupança associado a esta decisão, mas não o epíteto de “loja com maior número de queixas”, uma vez que se trata de uma decorrência normal de ser, de longe, a loja com maior número de utentes do país. 
E esse número de utentes decorre precisamente da sua localização – no centro de todos os meios de transporte – o que implica um espaço compatível com a dimensão da procura. Daí a renda, eventualmente, elevada. 
Para avaliar a poupança decorrente da deslocalização anunciada, ter-se-ia de considerar a destruição do investimento feito naquelas instalações, investimento que não é transferível para outro local porque não se trata de móveis, mas por ex: infraestruturas elétricas e informáticas complexas que vão ter de ser feitas de novo nas futuras instalações. 
Mas, segundo as notícias, o que se vai oferecer aos cidadãos não será o mesmo serviço que se oferecia nos Restauradores. 
É uma instalação dez vezes menor do que a atual, suficiente para um serviço de 2ª geração, ou seja, um atendimento pouco pessoalizado e muito informatizado, dirigido a quem lida bem com as novas tecnologias, que trata dos assuntos via internet em vez de ir para as filas das lojas do cidadão e que não representa mais do que 30% da população. 
Os restantes 70% vão perder o serviço que tanto procuravam. 
Não se está, portanto, perante uma poupança porque esta só tem lugar se o mesmo serviço for prestado por um custo inferior ou se for eliminado por ser supérfluo. 
Neste caso, a poupança passaria por uma renegociação da renda, possível com um senhorio em perspetiva de perder o inquilino. 
Tudo o resto é prejuízo para o Estado."

1 comentário:

Evaristo Ferreira disse...

Caro Francisco,
Fez bem em registar aqui, para a posteridade, as palavras da Ferreira Leite. É um sinal de que os "social-democratas" estão em desacordo com os neoliberais do PSD.
Um abraço.