terça-feira, 22 de dezembro de 2015

"Incompetência, irresponsabilidade e dolo"

O editorialista do "Público" não se contenta com menos: "O estouro do Banif é um exemplar manifesto de incompetência, irresponsabilidade e dolo." 

De facto até vai mais longe, zurzindo em Passos Coelho, Maria Luís Albuquerque e Carlos Costa, como quem malha em cereal na debulha: "Nestes três anos, Maria Luis Albuquerque, Pedro Passos Coelho e o Governador do Banco de Portugal limitaram-se (...) a tergiversar, a prometer soluções que ora não avançavam por causa da saída limpa, ora ficavam congeladas por causa do calendário eleitoral."

Eu não posso estar mais de acordo com estas conclusões, pois se impõem em face do que se ficou a saber sobre o caso Banif. O que me pergunto é onde é que o editorialista do Público descortinou uma suposta "aura de Pedro Passos Coelho como político responsável", aura que para ele só agora se apagou, mas que eu nunca vi. O que ao longo de mais de quatro anos me foi dado ver foi toda uma propaganda alicerçada em mentiras, sancionada e ampliada pela grande maioria dos órgãos de comunicação social. "Público" incluído. 

Será que agora, finalmente, com a direita afastada do poder, a comunicação social vai passar a encarar com objectividade a política de destruição do país que o governo Passos/Portas levou a cabo?
Estou para ver.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

"A política tem de começar a ser diferente da vigarice"

Oh sim, faço minhas as palavras do José Vítor Malheiros!
«(...)
Como se classifica um acto, praticado conscientemente, premeditadamente, por um grupo organizado de pessoas conhecedoras e com acesso a toda a informação, que se traduz na perda de milhares de milhões de euros para o Estado — no desaparecimento de milhares de milhões de euros dos nossos bolsos (para não falar nos prováveis despedimentos)? Como se classifica a propagação sistemática de mentiras sobre o nosso património por parte daqueles que foram encarregados de o gerir com o máximo de prudência, de transparência, de sensatez e no mais rigoroso respeito da legalidade? Como se classifica o recurso a mentiras e a esquivas sistemáticas para obter um benefício político imerecido? Como se classifica uma negligência reincidente desta dimensão por parte de uma (duas? três?) das principais entidades reguladoras nacionais?
(...)
É por isso que a primeira prioridade do Governo de António Costa e da esquerda que o apoia no Parlamento tem de ser devolver a credibilidade à acção política (apesar da herança do consulado do PSD e do CDS), devolver a credibilidade à acção governativa (apesar da herança do governo de Passos Coelho), devolver a credibilidade ao sistema financeiro (apesar do BPN, do BPP, do BCP, do BES, do Banif, do Montepio e do que mais adiante se verá) e devolver a credibilidade ao regime de regulação (apesar da inacção do Banco de Portugal e da CMVM), o que significará necessariamente reformar de forma profunda os procedimentos dos reguladores.

É preciso que o Governo actual e a esquerda que o apoia faça diferente e que mostre como é possível, necessário e benéfico fazer diferente. É por isso que a melhor notícia que tive nos últimos dias foi ouvir António Costa dizer que a solução encontrada para o Banif iria ter um "custo muito elevado para os contribuintes". Porquê? Porque, depois de quatro anos de falsidades e propaganda, cheguei a um ponto onde o que quero ouvir da boca do Governo não são boas notícias, mas apenas a verdade. Se pudermos ter um Governo que fala verdade, essa será a melhor notícia possível.
(Na íntegra: aqui
Destaque meu)

A mentira como banalidade

A mentira, durante a (des)governação Passos Coelho/Portas que contou sempre com o beneplácito e a cumplicidade de Cavaco, tornou-se uma banalidade. Ainda que não exactamente por estas palavras, foi este o sentido das declarações proferidas, há pouco, por Arménio Carlos, líder da CGTP, afirmação que ganha nova confirmação e mais elevada consistência se atentarmos no que foi a evolução, durante aquele período, do caso Banif.
A falta de seriedade das autoridades responsáveis pela solução do problema. durante o governo , felizmente, cessante  (o próprio Governo e o Banco de Portugal) fica bem clara perante estas notícias:
Só aldrabões ou também biltres?

sábado, 19 de dezembro de 2015

O candidato do "sim, mas também"

O candidato à Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa (em quem em nenhuma circunstância votarei) retratado, como merece, na genial rábula dos "Gato Fedorento".

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Conta-me histórias, Pedro...

...para ver se eu acredito:
"O PPE reagiu com moderação [à mudança de Governo em Portugal]  como, de resto, eu solicitei que fizessem"
Ah! Ah! Ah!
(Imagem e citação: daqui)

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Pobreza: palavras para quê?

Sim, para quê as palavras, se os gráficos do INE (surripiados aqui)  são perfeitamente esclarecedores sobre o aumento dos níveis de pobreza, como consequência das políticas ditas de "ajustamento" levadas a cabo pelo governo Passos/Portas, com a cumplicidade e conivência de Cavaco?
(Clicando na imagem, amplia)

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Palácio de Belém: de mausoléu a pátio de recreio?


Que toda a gente esteja cansada de ver o Palácio de Belém transformado em mausoléu, compreende-se. Já é, quanto a mim, motivo de grande admiração ver que há uma multidão de interessados em transformá-lo num pátio de recreio.
Garotão inteligente ele é! O meu voto não terá, não menos certo é!

Até no clima, senhores!

Progredir é um verbo que a Direita no poder não soube conjugar. ao longo de mais quatro anos, ou seja, durante todo o tempo da última legislatura. O país regrediu em todos os aspectos. Até no âmbito do clima, imagine-se. Pelo menos é o que dizem as notícias: "Portugal caiu dez posições num ranking climático internacional realizado por organizações ambientalistas. O país estava na nona posição e agora está na 19.ª, entre 58 países incluídos no Índice de Desempenho em Alterações Climáticas, da organização German Watch e da Rede Europeia de Acção Climática, apresentado esta terça-feira na cimeira do clima em Paris. O país foi penalizado pelo uso da carvão na produção eléctrica, pelo travão nas renováveis, pelos incêndios florestais e pelas suas políticas internacionais."
Quando até o clima agradece, como não ficar feliz com o facto de a dupla Passos/Portas, ter sido posta a andar! 
(notícia e imagem do Público)

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

"A nossa memória é curta, mas nem tanto"

«(...)
Marco António Costa, vice-presidente do PSD, assumiu ontem que é tempo de ser oposição, fiscalizando a "defesa do interesse nacional". Esta declaração seria responsável e séria, se não estivesse armadilhada no que a antecedeu e no que lhe sucedeu. Em ambos os casos, pelo meio das habituais expressões de que o poder foi tomado "de assalto", Marco António Costa referiu-se a contas.

Lembrou os cofres cheios e a dotação previsional de 62 milhões disponíveis para fazer face a imprevistos em dezembro (a tal almofada que não está tão macia como os recheados cofres). E voltou a garantir que os três por cento de défice serão atingidos "sem grande dificuldade", desde que António Costa e restante equipa "não estraguem", em 29 dias, o que PSD e CDS tão esforçadamente conseguiram em "1610 dias de trabalho".

O programa do PS foi aprovado no Parlamento há cinco dias, a 2 de dezembro. O país está a ser conduzido com base no Orçamento deixado pela coligação e começará 2016 a ser gerido em duodécimos. Por muito que o PS e a Esquerda sejam gastadores e responsáveis por nos deixar a troika à perna, é preciso ter esta cantiga entranhada no ouvido para acreditar que, se falharmos a meta do défice, a culpa só poderá ser destes terríveis assaltantes ilegítimos do poder.

Mas como a lógica não basta, olhemos então para as contas divulgadas, a fechar a semana, pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Nos primeiros nove meses do ano, o Estado terá tido um défice de 3,7%, o que torna "exigente e de difícil concretização" a meta estipulada por Passos Coelho para o ano - exatamente um ponto abaixo. Mas se há derrapagem nas metas, esqueça-se quem esteve no poder 336 dias. A culpa será sempre dos últimos 29. Estranha matemática.
(...)»
(Inês Cardoso:"Memória curta". Na íntegra: aqui)

Trabalhos de campo # 21 (Rola-do-mar)




Rola-do-mar ou Vira-pedras (Arenaria interpres L.)
Mais informação: aqui
Local e data: Setúbal; 5 - Dezembro - 2015
(Clicando ns imagens, amplia)

domingo, 6 de dezembro de 2015

Vão por bom caminho...

Duvidam? Ora vejam, o que diz o vosso amigo Pedro Marques Lopes:
«(...) Seja como for, não se percebe onde se quer chegar com a conversa de mau perdedor.
(...)
O que o discurso da ilegitimidade não dará ao PSD e ao CDS é qualquer legitimidade acrescida ou qualquer tipo de razão especial se este governo cair por falta de solidez dos apoios que hoje aparenta ter. Se o governo não conseguir manter-se em funções será porque os representantes do povo assim o decidiram, como decidiram agora viabilizá-lo. Só e apenas.
Esta espécie de estratégia de rapazinho a quem tiraram a bola não pode durar muito, claro está. Um partido como o PSD terá de ter uma oposição que mostre um caminho alternativo, mas ficará esta mancha dum tempo em que se mostrou não se saber lidar bem com as regras da democracia representativa, em que o partido não honrou o seu passado e deixou uma memória que pode sair-lhe cara no futuro.» (fonte)

sábado, 5 de dezembro de 2015

Por favor, continuem...

Portugal agradece.
Sim, o que é que o país pode esperar duma coligação cujos membros mais não fazem do que expressar azedume e raiva porque, julgando "ter ganho as eleições", julgavam-se também no direito de continuar a (des)governar o país, esquecendo-se que na Assembleia da República existe hoje uma maioria que decidiu, e bem, não permitir que levassem por diante a destruição do país, tarefa a que se dedicaram, com afinco e entusiasmo, durante mais de quatro anos.
Continuem, pois, a entreter-se a gritar, a insultar e a chorar baba e ranho. Eu estou a gostar de vos ver. 
E, confesso, já foi um prazer ver-vos ir ao ar!



O que é que mudou?

«(...)
Os governos, sejam conservadores, sejam socialistas, sejam o que forem, estão condenados a seguir a mesma política económica e social, e é essa política que define o “arco da governação”, o clube de partidos em que o voto dos eleitores serve para governar. O resto é um voto de segunda, tribunício e ineficaz, quase lúdico. Durante quatro anos em Portugal, só um punhado de pessoas que se contavam pelos dedos de uma mão é que resistiu a esta “inevitabilidade”, e mesmo os revoltados com a situação ficavam deprimidos com a falta de saídas previsíveis.

Pois tenho novidades para vos dar, surpresa!, de repente, saímos e saímos com uma genuína ruptura. Voltemos à história. O que hoje se passa em Portugal mostra como a história é sempre surpresa e é por isso que é inovadora, para o bem ou para o mal. A maioria dessas surpresas é má, algumas muito más. Existe uma maldição, que passa por ser chinesa, embora tenha sido escrita por um inglês, e que diz: “Que vivas em tempos interessantes.” Vivemos hoje em Portugal esses ”tempos interessantes”, com todos os riscos inerentes. A quantidade de coisas que mudou nas últimas semanas criou esse carácter poiético da história, criador e carismático, o que também significa que a sua novidade traz ao mesmo tempo esperança e insegurança. Insisto: nada garante que o que se está a passar é, como dizem as pessoas, “para melhor”, mas apenas que é diferente. E essa diferença exactamente por ser genuína não pode ser prevista, e as suas consequências e “normalização” também não. Mas uma coisa é certa: exactamente porque é uma genuína alteração, uma mudança, as pontes com o passado foram cortadas e o caminho para trás é impossível. Isso não significa que as forças do passado não estejam cá connosco, ainda assarapantadas com o que aconteceu, mas não menos vivas e perigosas. “Que vivas tempos interessantes.”

O que é que já mudou? Nos últimos meses, formou-se uma aliança, minimalista, débil, mas proactiva e aguerrida (o primeiro acto da coligação foi derrubar um governo) entre três partidos da esquerda, incluindo partidos desavindos há quarenta anos como o PS e o PCP. Por muitos sinais que houvesse, e nem sequer havia muitos, tal não era previsível que acontecesse. O facto de acontecer teve que ver com a existência de condições para que acontecesse, a perda de maioria absoluta em eleições de uma coligação que governava Portugal, mas tal já se tinha dado no passado sem estas consequências. É a aliança PS-PCP-BE que é nova e o novo ambiente que traz à vida política à esquerda e o efeito de acantonamento que traz à direita.

Essa aliança faz-se em volta de um governo de centro-esquerda que permanece no mainstream da vida política nacional e europeia, e que é tudo menos radical. Dizer que é uma “frente popular” só pode ser dito por ignorância, mas, para não variar, a ignorância floresce nestes epítetos. O Governo minoritário do PS assenta numa aceitação, com muita má vontade, diga-se, dos constrangimentos do Tratado Orçamental e num gradualismo que encontrou na voz do PCP, no debate da moção de rejeição, a sua melhor expressão, também ela contra-intuitiva, mas mais razoável inclusive do que no BE — Jerónimo de Sousa a dizer: “O nosso povo sabe que não pode tudo ser feito ao mesmo tempo.”

Ao mesmo tempo, uma direita cada vez mais à direita, que vinha de um razoável resultado eleitoral, se se tiver em conta as circunstâncias adversas, muito agressiva na comunicação social, detendo cumplicidades extensas com sectores económicos e os novos think tanks de direita nas universidades e fundações, e que governou como quis e lhe apeteceu nos últimos quatro anos, viu-se subitamente colocada em minoria e bloqueada de um acesso ao poder que entendia ter por direito próprio. Essa minoria da direita estava inscrita nos resultados eleitorais, mas a direita nunca pensou que a maioria adversa fosse materializada num entendimento político.
(...)»
(José Pacheco Pereira: A história é sempre surpresa. Na íntegra: aqui.)

Trabalhos de campo # 20 (Maçarico-das-rochas)




Maçarico-das-rochas (Actitis hypoleucos L.)
Mais informação: aqui)
Local e data: Parque da Paz - Almada; 4 - Dezembro - 2015
(Clicando nas imagens, amplia)

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

"O tabu da oposição"

«Primeiro-ministro, a palavra, é o tabu da oposição. Um deputado do PSD que passe por um governante e diga "o amigo é o primeiro ministro que vejo hoje nos corredores", sublinharia logo: "Primeiro ministro sem hífen, atenção!" À direita, a palavra "primeiro-ministro" está tão banida como "bomba" em aeroporto americano. Esta semana, na discussão do programa do Governo, Passos Coelho disse: "Este Governo, assim como o seu chefe..." Kaput ao inominável cargo! Como Portas é só líder secundário da oposição, já pode ser menos radical: "Senhor primeiro-ministro, vírgula, mas senhor primeiro-ministro que o povo não escolheu." E Telmo Correia, ainda mais secundário, também pode dizer o palavrão, já que lhe acrescenta a irrisão: "Primeiro-ministro não eleito." Primeiro-ministro sozinho é que não, é pecado capital, quem o disser denuncia-se como assinante do Avante. Entre a gente bem, dizer "primeiro-ministro" é como dar dois beijinhos na face, sei lá... Um anátema não se explica, diz-se pela boca fora. Telmo Correia - tão contra primeiros-ministros que não são eleitos como tal! -, quando foi ministro (do Turismo), foi com Santana Lopes que, substituindo Durão, saiu da Câmara de Lisboa para ocupar o cargo de primei..., perdão, coiso. E que dizer da semana passada, quando Cavaco empossou o Governo? Vocês julgam ter visto Passos cumprimentar o novo primeiro-ministro, mas não. Dizia-lhe: "Que faz aqui no bairro, António, veio aos pastéis?

"Acerca da ética do ódio e da credibilidade do jornalismo a sério"

«(...)
Diana Andringa, jornalista veterana, publicou há semanas Funcionários da Verdade, que nos ajuda a perceber alguns dos mais banais (...) riscos na vida dos jornalistas. O livro, que é uma tese de doutoramento e que apresenta uma investigação cuidada sobre a selecção das prioridades noticiosas, o alinhamento dos telejornais, a escolha dos temas noticiáveis e dos temas não-noticiáveis, usa alguns casos fortes para retratar a vida na TV portuguesa: o caso Subtil (um homem que se barricou numa casa de banho da entrada da RTP), a cobertura da campanha do referendo sobre o aborto e o caso do “arrastão” de Carcavelos. Em todos eles, houve enviesamento, escolhas duvidosas, populismo mediático, preconceitos, a lei do mercado das audiências a determinar erros de informação e até notícias falsas.

(...)

No entanto, nada nos prepararia para a ética do ódio, como a que surgiu vibrante no caso Sócrates. Ora, foi neste processo e foi entre jornalistas, como Manuel Carvalho sublinhou, que se exprimiu o mais desbragado ajuste de contas.

Francisco Gonçalves, “editor do Mundo” no Correio da Manhã, destacada função, escreve que José Sócrates não “parece merecer melhor destino do que a prisão”, até porque “se há alguma coisa a lamentar no seu caso é que a detenção tenha chegado tão tarde”.

No PÚBLICO, João Miguel Tavares clamou pelo seu direito pessoal “de presumir, face ao que leio nos jornais, às minhas deduções, às minhas convicções, à minha experiência, à minha memória e ao esgotamento de sete presunções de inocência, que Sócrates é culpado daquilo de que o acusam”. Ou seja, pelas “minhas deduções” e pela “minha experiência” em coisas como a compra da TVI pela PT, “presumo” que Sócrates recebeu não sei quantos milhões de euros sei lá de quem e que comprou uma casa milionária no Seizième.

Com o mesmo acinte, José Manuel Fernandes argumenta superiormente, noObservador, que “a a dúvida que havia sobre José Sócrates era sobre se seria algum dia apanhado”.

Ou seja, todos eles sabem que o homem é culpado e lamentam que a detenção seja tardia. Têm motivos de sobra para ter a certeza que ainda falta ao tribunal: João Miguel Tavares foi levado a tribunal por Sócrates, num processo patético por difamação, logo sabe que um sujeito tão arreliante só pode ser culpado; José Manuel Fernandes sabe, simplesmente porque sabe tudo; e o homem do Correio da Manhã sabe porque decerto leu as manchetes do seu jornal.

Ora, quando os jornalistas escrevem opinião – dizendo o que entendem sobre o que entendem – estão a arriscar-se a subordinar o seu dever de informação, bem como o peso social gerado pela visibilidade da função de informar, ao seu direito de ajustarem contas, de tomarem partido, até de suspeitarem. É porque são jornalistas com coluna publicada ou com editorial que a sua opinião conta, ou seja, importam porque se presume que farão o trabalho de jornalistas, mesmo quando o estão a contrariar, substituindo informação por uma campanha. Naturalmente, quando se dedicam a fazê-lo sob a forma sublime da conversa de café, o uso do poder discricionário da sua opinião sentenciosa é mais flagrante.

Este é o caso dos acórdãos de Tavares, Fernandes e Gonçalves sobre o processo em apreço. De facto, eles não sabem nada: não sabem o suficiente sobre os factos, porque ninguém o sabe entre o público, e mostram saber pouco sobre a lei, que tinham obrigação de conhecer. E, se apresentam conclusões, simplesmente porque consideram que o seu próprio ódio pessoal é suficiente para condenar outrem, estão não só a desmerecer a profissão de jornalista, porque abusam do seu poder, como estão a escrever torto por linhas pouco direitas.

O que se esperaria de um jornalista seria o tratamento da informação com os dados disponíveis, sem aceitar ser porta-voz de alguém que na acusação (ou, noutros casos, na acusação ou na defesa) use a comunicação social para ganhar tempo e convicção para a investigação que ainda não terá obtido resultados bastantes. E esperar-se-ia igualmente que tratasse todos os casos da justiça com o mesmo critério: seja Ricardo Salgado, seja José Sócrates, seja quem for tem o direito a essa resistente regra social, que abrange do mesmo modo as obrigações da informação e da opinião pública, que é o direito de defesa.

Se esse direito for enfraquecido, teremos o pior de todos os resultados: a corrupção será facilitada, pois a justiça claudicará, acusará erraticamente e condenará quando calha, porque lhe faltará investigação que conduza a acusações consistentes sobre factos, preferindo então usar a facilidade da coluna de jornal e substituindo as provas pelo imediatismo da sentença lavrada em ódios de estimação. Era melhor levar a sério o perigo da corrupção, que é monumental em Portugal: a transparência da vida social, a informação rigorosa e a lei equitativa podem combatê-la, mas o jornalismo serviçal de uma ideia, de uma pessoa ou de um ódio é manifestamente irrrelevante ou prejudicial contra a justiça justa.»

(Francisco Louçã. Na íntegra: aqui)

Uma almofada de ar e vento

Visto isto (Margem orçamental praticamente esgotada), a famosa "almofada" ficou reduzida a ar e vento.
Nada que não fosse expectável, tendo em conta que o governo Passos/Portas era um governo de farsantes. E de aldrabões, claro está.


A retórica e a realidade

Quem olha hoje para a Assembleia da República não pode deixar de reparar nas muitas mudanças operadas em poucos dias. Desde logo, a nova centralidade que o Parlamento assumiu na ausência de um governo de maioria absoluta. António Costa tem apoios parlamentares que faltaram a Passos Coelho, mas não se pode dizer que disponha de maioria absoluta. E isso faz toda a diferença.

A diferença de ser o primeiro governo socialista apoiado à sua esquerda. A diferença de ser o primeiro governo da responsabilidade do segundo partido saído das eleições. A diferença de, em três semanas, quem liderava a oposição ter passado a liderar o governo, e vice-versa. Tudo normal, democrático, constitucional e politicamente legítimo. Descontada a retórica e o discurso de conveniência, a realidade política é esta.
(António José Teixeira; "Isto anda tudo trocado". Na íntegra: aqui. Destaque meu.)

Trabalhos de campo # 19 (Pilrito-das-praias (Calidris alba)


 Pilrito-das-praias (Calidris alba Pallas)
(Local e data: Estuário do Tejo - Almada; 3 - Dezembro - 2015)
(Clicando nas imagens, amplia)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Finalmente dispensado!

O ministro Vieira da Silva dirigindo-se a Paulo Portas durante o debate do Programa do XXI Governo Constitucional:"O povo disse que o seu  contributo para o Governo de Portugal era dispensável, está dispensado".

Gente (muito) burra!

Com a eleição do actual presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues; a rejeição do programa da 2ª versão do governo Passos/Portas; e com a derrota da moção de rejeição com que o PSD/PPD e o CDS/PP quiseram inviabilizar a entrada em funções do XXI Governo Constitucional, contam-se já por três as vezes que a direita teve a oportunidade de aprender a contar e de ficar a saber que 107, número de deputados que os dois partidos da direita têm na Assembleia da República, é um número inferior a 122, número de deputados dos partidos que se comprometeram com a viabilização de um Governo do PS.
A conclusão parece impor-se, atendendo à forma como os deputados de direita, a começar pelos seus líderes, Passos Coelho e Paulo Portas (na imagem), continuam a lamuriar-se por terem sido despedidos do governo pelo Parlamento, clamando ao mesmo tempo que é "ilegítimo" o Governo que hoje mesmo viu o seu Programa ser viabilizado pela Assembleia da República.
É verdade que, com esta conclusão, estou a chamar burra, muito burra mesmo, à representação parlamentar de direita e aos seus líderes, muito em particular, mas não é menos verdade que, procedendo desta forma, estou a levar a extremos a minha benevolência. De facto, se afastar aquela conclusão, teria de presumir que a direita parlamentar se dá muito mal com a democracia, a pontos de nem sequer conhecer as suas regras.
E de tal presunção, zeus me livre e guarde. 
(imagem do DN)

Para grande desgosto dos marretas

"Os juros das Obrigações do Tesouro a 10 anos abriram esta quarta-feira a cair para 2,26%, mantendo a trajetória de descida para mínimos de sete meses em dia de início do debate do programa do novo governo" (fonte)

Frases marcantes do debate sobre o Programa do XXI Governo Constitucional


«O anterior Governo disse aos jovens: "Vão-se embora porque não tem futuro em Portugal". Nós dizemos, voltem porque sem vocês Portugal não tem futuro.» (António Costa, primeiro-ministro)

«Apresentem pois a moção de rejeição, nós cá estaremos para a chumbar.» (Catarina Martins, porta-voz e deputada do Bloco de Esquerda)

«A precariedade já não é só do trabalho, mas da própria vida, todos os dramas que atingem milhões de portugueses, continuam a ser desprezados por PSD e CDS, que preferem alimentar uma estéril guerrilha política.» (Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP)

«A expressão "saída limpa" foi um resultado pequeno para uma propaganda enorme. Não vendemos ilusões, nem apresentamos quimeras, porque medimos económica e financeiramente todas as propostas que fazemos.» (Mário Centeno, ministro das Finanças)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Cavaco: um caso perdido

Não é novidade para ninguém que Cavaco só indigitou António Costa para primeiro-ministro e só empossou o XXI Governo Constitucional, porque, nos termos da Constituição da República, não tinha outra alternativa,
Se alguém tinha dúvidas a respeito, Cavaco encarregou-se de as desfazer, não apenas através de dois discursos que nenhum democrata digno desse nome proferiria e impensáveis na boca de um Presidente da República empossado nos termos da vigente Constituição da República que atribui a quem desempenha tais funções o papel de árbitro, por definição, imparcial e, como tal, encarregado de garantir o regular funcionamento das instituições da República. Reporto-me aos discursos proferidos por Cavaco, um no momento da indigitação de Passos Coelho e outro aquando da tomada de posse do XX governo constitucional liderado pelo mesmo Passos Coelho, governo que, como se sabe, acabaria por ser demitido na sequência da rejeição do seu programa pela Assembleia da República. Em tais discursos, Cavaco não se inibiu de mostrar a sua forte oposição a uma solução governativa da responsabilidade do PS que pudesse vir a contar com o apoio parlamentar dos partidos à sua esquerda (PCP, Bloco de Esquerda e PEV) partidos em relação aos quais Cavaco teve palavras de puro ódio, inimagináveis mesmo para quem já o considerava, desde há muito, como um presidente de facção.
Se, apesar das evidências resultantes dos discursos, alguém ainda alimentava dúvidas sobre a falta de isenção de Cavaco no exercício das suas funções com presidente da República, o próprio tomou sobre si o encargo de as remover. De facto, Cavaco, após o derrube do XX governo constitucional, protelou, com grave prejuízo para o país, a indigitação de António Costa como primeiro-ministro do XXI Governo Constitucional, muito para lá do que seria expectável, a pretexto duma escusada e improfícua deslocação à Madeira e da pretensa necessidade de ouvir algumas individualidades, muitas delas com representatividade mais que duvidosa, e outras que não se representam senão a elas próprias. Protelamento que, de tão absurdo e prejudicial para a vida do país, só pode ser explicado pelo próprio Cavaco. Na falta de dados objectivos teremos de nos ficar pela conjectura e perguntar: será que Cavaco alimentou a secreta esperança de, com o decorrer tempo que ele propositadamente alongou,  ver desabar a solução governativa acordada entre os vários partidos da esquerda com assento no hemiciclo de S. Bento? 
Certo, certo é que a solução alternativa não desabou e certo é ainda que Cavaco desperdiçou uma última oportunidade de ouro para, de algum modo, refazer a imagem com que vai passar à história, imagem que, nesta altura, é a de um presidente da República desprestigiado que a grande maioria do povo português anseia por ver partir, As sondagens sucessivamente publicadas não deixam margem par dúvidas sobre esse ponto.
Quando falo em oportunidade desperdiçada refiro-me à cerimónia de posse do XXI Governo Constitucional. Cavaco é considerado como um institucionalista. Não sei se o qualificativo lhe assenta bem ou não. O que sei é que, mesmo num acto revestido da solenidade e da importância institucional duma posse de Governo, Cavaco foi incapaz de disfarçar a acrimónia com que tratou o primeiro-ministro e o Governo a que, forçado embora pelas normas constitucionais, deu posse. O discurso então proferido, repleto de ameaças veladas, mas, felizmente, inconsequentes, porque não conseguirá concretizá-las, e o facies crispado do empossante durante toda a longa cerimónia não deixam dúvidas sobre a parcialidade e a manifesta ineptidão de Cavaco para o desempenho do cargo de mais alto magistrado da nação.
Não tendo aproveitado a referida oportunidade,  Cavaco é, hoje, sem dúvida,  um caso perdido, pois já não terá outra para se redimir. E não terá, porque, Cavaco já não tem futuro. Como já alguém disse,"Cavaco Silva já só tem passado"

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Antes de o ser, já o era?

Apesar de lido, custa a acreditar que a falta de honestidade intelectual tenha chegado a tais extremos. Rezam "as crónicas" que a deputada da coligação PàF, e vice-presidente da bancada parlamentar do CDS, Cecília Meireles teve o desplante de atribuir ao PS a responsabilidade pela estagnação da economia portuguesa ontem anunciada pelo INE relativamente ao 3º trimestre deste ano, período, durante o qual, recorde-se, o país continuou a estar sujeito à governação da direita.
Diz a deputada que "o CDS alertou várias vezes para aquilo que infelizmente está agora a acontecer. A situação de instabilidade política que se gerou e que se gerou sobretudo pela actuação do PS tem consequências". 
Instabilidade política quando o país era governado pelos partidos da direita, PSD e CDS? Quem, antes das eleições, se teria lembrado de uma coisa destas? Nem a deputada Cecília Meireles, aposto eu.
Mesmo que para ser deputado/a não seja pedida aos candidatos a comprovação de posse de algum grau de sensatez, não pode deixar de ser exigido a quem se senta nas bancadas do Parlamento um mínimo de seriedade, mínimos que a deputada Meireles, pelos vistos, não tem.

"Uma moçãozinha se faz favor para destroçar a tropa fandanga que ocupou S. Bento"

«Estou indignado com a hesitação da direita acerca da insigne questão que mais se discute nos cafés, em casa e nos intervalos do trabalho e que tem Portugal em suspenso: vão ou não os legítimos apresentar uma moção de rejeição que arrase com o bando de irresponsáveis que ocupou o parlamento? Vão apresentar a folha que não vai deixar pedra sobre pedra, que rebenta tudo num fogo de artifício que ilumine Almada?

Chegou-me aos ouvidos, ou lendo uma gazeta, que havia dúvidas entre os legítimos. Não posso acreditar.

Anda o eurodeputado frenético na televisão, vociferam os cabos partidários, marcham as concelhias a oferecer tropas, houve até uma manifestação de 40 pessoas contra o golpe de Estado e eu sei que não são tantas quanto a indignação que ferve pelo país, mas são só os arautos da vaga fulminante que está para chegar, e há quem se amedronte, quem hesite, quem se pergunte, quem consulte o comité?

Já era de desconfiar pelo ar seráfico com que Passos Coelho se sentou para tirar fotografias para o cartão de deputado, ele, que é primeiro ministro pela graça altíssima. E pelo silêncio divertido de Portas, como se preferisse a farra dos debates, já não há mais viagens, nem feiras internacionais, nem contratos nos Emiratos Árabes Unidos, nem Cazaquitão, nem Venezuela, nem Roma, nem Berlim, nada de nada. Já era de desconfiar pelos abracinhos de Costa a Merkel, a fingida.

Há marosca no ar, notei isso quando os chefes dos legítimos passaram pelo corredor nos Passos Perdidos como se aquilo fosse o seu lugar, e então o destino, os deuses, o cosmos, até os amigos? Cem nomeações nas últimas horas, ora quantas famílias ficaram esquecidas, digam lá? Não, nunca, jamais, cada portaria, cada venda assinada à pressa foi uma confissão de que esperam que se instalem os ilegítimos ou, nem quero pensar, aceitam os golpistas e recomendam-lhes o ministério.

Foram traídos pelo homem de Belém, é certo. Magoou, não se esperava isto mas antes um arroubo de patriotismo e de partido que fechasse as portas, aqui não entra gentalha, não passarão nunca. O homem resmungou e exigiu explicações, logo ele que sabe tudo e raramente se engana, como se pudesse ter dúvidas sobre a tragédia nacional que foi aquela gente alcandorar-se ao poder, mas cedeu, traiu é a palavra certa, deu posse àquela maralha e retirou-se altivamente para o esquecimento.

Mas agora chegou a hora da decisão, da nossa decisão. E peço. Não, exijo, exijo mesmo uma moção, uma carga de cavalaria pelo menos em papel para dispersar a turba, para arrasar esses maltrapilhos, para pôr na ordem a multidão. Uma moção enérgica, uma rejeição firme que permita aos nossos deputados não serem enxovalhados pelos descamisados que lhes vão perguntar pela consequência. Havemos de levantar os olhos e dizer: aqui está a vossa lápide, a moção acaba com os ilegítimos, sacode os fracos, devasta os planos que andaram a negociar com esses suspeitos que nem são os do costume, restitui a economia aos seus donos, confirma o caminho árduo e certo que os nossos chefes traçaram para o país, dá rumo à vida. A moção reconquista o nosso Portugal.

É só isso que devem discutir hoje de manhã na comissão respectiva. Mandar uma bombarda contra S. Bento ou ficar sentados. O CDS, de sangue na guelra, já autorizou a moção defenestradora. O PSD é que hesita, logo ele, o legítimo dos legítimos. Constou-lhes que Costa põe uma vela pela moção, que lhe dá um jeitão, que assim lhe oferecemos tem a sua moção de confiança e que, alegando a moção que ele é ilegítimo, fica-lhe reconfirmada a legitimidade porque é voto maioritário em órgão soberano, ou seja, a moção teria a virtude de antes de o ser já não era. Parco resultado para muito esforço, ajudar o adversário então, dizem estas insinuações maledicentes.

Constou-lhes ainda, no PSD, que a esquerda, nos seus tratos com o PS, prefere um CDS colado ao PSD por pactos de sangue e morte, do que solto a fazer cálculos eleitorais. Parece até que prefere que jurem que vão juntos às putativas eleições, mesmo que elas sejam mais tarde, que isto de esperar pelas colheitas do Verão parece mais coisa de agricultor rotinado do que de político sábio.

Não liguem, companheiros. Senhores e senhoras, às vossas armas e fogo à peça. Ou uma moção, pelo menos. Não podemos passar quase dois meses em aflições para que os legítimos, que são Passos e Portas, saiam agora mansamente de cena como se a sua vez tivesse acabado.

Não se rendam, não se calem, não deixem de mocionar o parlamento, sempre em frente, carga a trote, berros ao alto, mostrem como se atropela o centro, moderados são os cobardes, guerra sem quartel, não há prisioneiros.

Mas se não for porque a afronta exige um banho de rejeição, que seja pelo menos para que Portugal possa saber que a maioria que ficou minoria e que sabe que ganha mesmo quando perde porque está escrito no destino, e quem escreve o destino perguntará você, pois é a minoria que se declara maioria mesmo quando continua minoria, que demanda votos mas que lhe faltam, tudo talvez um pouco confuso mas o resultado é que importa: rejeitar os ilegítimos e entregar o governo a quem deve mandar, ganhando ou perdendo.

Porque sim, é o destino, e o destino é mais belo do que a aparência e os bons costumes. Nascemos para governar, a ilegitimidade é afrontosa porque questiona o destino. Varramos essa gente com uma moção e tenho dito.»
(Francisco Louçã)
(Reproduzido na íntegra, porque julgo que a publicação original não é acessível a quem não seja assinante do "Público" on line. Imperdível.)

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Uns lançam os foguetes e outros levam com as canas!

Durante a campanha eleitoral os partidos da coligação PàF fartaram-se de deitar foguetes: ele era a devolução de 35% da sobretaxa do IRS; ele era a economia em crescimento. Enfim, navegávamos em mar de rosas.
Foram-se as eleições e agora temos a realidade: a devolução da sobretaxa foi um ar que lhe deu e no que respeita à economia, diz o INE, o crescimento do PIB foi nulo entre o segundo e o terceiro trimestre deste ano. ou seja, em vez do crescimento sustentado que nos foi anunciado e prometido, passámos a ter estagnação.
Eles lançaram os foguetes, agora, depois da "festa", somos nós (todos os portugueses) a levar com as canas.
Espera-se que, nos tempos mais próximos, o novo Governo não se esqueça de as devolver à proveniência. Senão todas, pelo menos, algumas, 

sábado, 28 de novembro de 2015

Um Outono glorioso*








[Hoje, na Fonte da Telha: vistas da Arriba Fóssil da Costa da Caparica e fêmea de Cartaxo-comum (Saxicola rubicola)]
* Glorioso, a vários títulos.

"Acabou!!!! Acabou. Acabou?"*

«Acabou!!!!

Experimentem dizer “acabou” junto de uma das inumeráveis vítimas destes anos de “ajustamento” e vão ver como é a resposta. Eu já experimentei várias formas e têm todas um ponto de exclamação no fim ou outro qualquer expletivo. Ou é um suspiro fundo de quem atravessou um trajecto complicado e, chegado a outro lado, respira longamente de alívio; ou é um alto e sonoro “acabou” como antes do 25 de Abril se chegava ao “às armas” da Portuguesa e de repente toda a gente gritava a plenos pulmões; ou é uma espécie de vingança saborosa em ver na mó de baixo aqueles que sempre entenderam que têm o direito natural de estar na mó de cima.

Ou há mesmo uma variante irónica, como se o “acabou” fosse semelhante ao do episódio dos Monty Python em que uma personagem num pub dizia para um eleitor circunspecto do PAF ao lado “you know what I mean?” e tocava-lhe nos braços numa cumplicidade admitida. Wink, wink. No episódio, depois queria vender-lhe fotografias pornográficas: “you know what I mean?” Aqui, era uma fotografia de Cavaco Silva a “indicar” António Costa, wink, wink. Até eu fico da escola do engraçadismo, imaginando alguns personagens que andaram a insultar a nossa inteligência, a mentir-nos descaradamente, e a atacar o bolso dos que não se podiam defender, culpando-os de “viverem acima das suas posses” e de serem “piegas”.

“You know what I mean?”. Piu-pius governamentais que vivem no Twitter; irrevogáveis de geometria variável; o “impulsionador jovem” que aos saltos no palco dizia à assistência “ó meu, isso da história não serve para nada”; os “justiceiros geracionais” que queriam tirar as reformas aos pais e avós para em nome de uns abstractos filhos e netos as darem a “outros” pais e avós, bem vivos e presentes, em nome da “estabilidade do sistema financeiro”; os neo-malthusianos que nos encheram de simplismos gráficos em que se escolhiam os parâmetros e se excluíam outros para concluir que “não há alternativa”; os arrojados ultra-liberais, que queimam o valor dessa bela palavra de liberdade, e que proclamam que nunca, jamais e em tempo algum quereriam “casar” com as “esganiçadas” do Bloco, sem sequer perceber o que lhes diz o espelho; as mil e um personagens ridículos cuja desenvoltura vinha de terem poder, estarem encostados ao poder e entenderem que tinham impunidade para pisar os outros porque eram mais fracos e tinham menos defesas. Vamos todos dançar a tarantela para expulsar o veneno.

Acabou!!! Sabem ao que me refiro? Sabem, sabem. Bem demais.

Acabou.

Acabou. Percebe-se no ar que chegou ao fim uma época, um momento da nossa vida colectiva e que existe um desejado ponto sem retorno. E, na verdade, para “aquilo” já não é possível voltar, pode ser para outra coisa pior ou para outra coisa diferente, mas para o mesmo já não há caminho.

O modo como “acabou” conta muito, porque é diferente dos modos tradicionais da vida política portuguesa. Se o governo PSD-PP tivesse acabado nas urnas por uma vitória do PS mesmo tangencial, o efeito de ruptura estaria muito longe de existir, mesmo que o governo PS não fizesse muito de diferente do que o actual governo minoritário vai fazer. Foi a ecologia da vida política portuguesa que mudou, com o fim da tese do “arco de governação” e, mais do que qualquer solução, que pode ser precária, não durar ou acabar mal, acabou a hegemonia de uma das várias construções que suportavam a ideologia autoritária que minava a democracia nestes dias, a do “não há alternativa”.

Acabaram os votos de primeira e os de segunda, com o escândalo de também os votos de um torneiro numa oficina de reparações, que faz todas as opções erradas e tribunícias, é sindicalizado nos metalúrgicos, vive na margem sul, e vota na CDU, também valer para que haja um governo de pacíficos funcionários públicos e professores que votam no PS, ex-membro do “arco da governação”. Não é por amor ao governo de Costa, nem ao PS, é outra coisa, é porque não queriam os “mesmos” e foi essa força que os fez acabar. Vem aí o PREC? Se a asneira pagasse multa podíamos enviar os asneirentos num pacote para pagar a dívida e ainda ficávamos com um superavit.

Pode até não mudar muito, porque já mudou muito.

Acabou?

Não. Há muita coisa que não acabou. Há um rastro de estragos, uns materiais e outros espirituais, que não vão ser fáceis ou sequer possíveis de superar numa geração. Sempre que um jornalista fizer a pergunta pavloviana de “quem paga?” ou “quanto custa?” só sobre salários, pensões e reformas, ou seja aquilo que interessa aos que tem menos e nunca faça a mesma pergunta em primeiro lugar, e muitas vezes único lugar, para tudo o resto, benefícios fiscais, impostos sobre os lucros, “resolução” de bancos, PPPs, swaps, etc. ainda não acabou. Sempre que alguém “explicar”, com um encolher irónico dos ombros e completa e absoluta indiferença, a ineficácia da fiscalidade sobre a riqueza, porque os capitais “deslocam-se” como água para outros sítios, para offshores, e podem sempre fugir, e por isso “não vale a pena” sequer admitir tentar taxá-los, ainda não acabou. Sempre que se considera como normal que quem manda em nós, eleitores, portugueses, Portugal, são uns burocratas de Bruxelas e uma elite de governos europeus, que nos governam por “instruções”, “directivas”, “regras”, interpretadas rigidamente para países como Portugal e com ampla folga para países como a França, ainda não acabou. Sempre que o dolo, a violação da confiança e dos contratos com os de “baixo” e a inviolabilidade com os de “cima”, continuar a ser a prática de um estado de má-fé, ainda não acabou. Sempre que se cultive, dissemine, impregne, envenene a vida pública com a indiferença com a pobreza, o desemprego, a quebra de qualidade de vida, a perda de dignidade quando se vê a casa penhorada , ou se perde o carro na frágil classe média que criamos depois do 25 de Abril, retirando da pobreza muitas famílias para lhes dar outros horizontes pelo trabalho e, aos seus filhos, pela educação, e se vê tudo isto como efeitos colaterais não se sabe de quê, embora se saiba para quem, ainda não acabou. Sempre que se despreza os que vivem com dificuldades do seu trabalho e se valorize a esperteza e o subir na vida, ainda não acabou. Sempre que se violam direitos sociais, protecções aos que menos força têm, reivindicações de gerações inteiras, ainda não acabou.

Sempre que se acha que isto é radicalismo e não decência, ainda não acabou.»
(José Pacheco Pereira)

* Publicado aqui. Reproduzido na íntegra, porque suponho que não é acessível a quem não seja assinante do Publico on line.

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Avisem o homem que ele julga que ainda é pres(id)ente !

Cavaco Silva já só tem passado. A posse de António Costa como primeiro-ministro encerra um mandato fracassado. Não pôde, ou não soube, ser elo de compromisso. Dividiu o país à medida que se centrou mais e mais em si próprio. Desvalorizou-se e desvalorizou o papel do Presidente. Revelou-se um Presidente sem perfil presidencial.
(António José Teixeira: via Estátua de Sal)

Até os "mercados" ajudam à festa!

"Os juros da dívida pública portuguesa no mercado secundário estão a cair em todos os prazos. A dez anos, os juros negociaram nos 2,269% o valor mais baixo desde 23 de Outubro." (fonte)

«UM TEMPO NOVO PARA PORTUGAL E PARA OS PORTUGUESES»

Discurso de tomada de posse do Primeiro-Ministro do XXI Governo Constitucional*

«Senhor Presidente da República
Senhor Presidente da Assembleia da República
Senhor Presidente do Tribunal Constitucional
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
Senhor Primeiro-Ministro cessante,
Demais Autoridades civis, militares e diplomáticas,
Minhas Senhoras e meus Senhores

É com muita honra, mas é sobretudo com profundo sentido de serviço ao País e à República, que hoje assumo, diante de todos os portugueses, meus concidadãos, a exigente tarefa de liderar o Governo de Portugal.

Num tempo que todos sabemos ser de muitas incertezas e enormes desafios - para o nosso País, mas também para a Europa e para o Mundo - não ignoro, e portanto não minimizo, as muitas dificuldades que temos pela frente, nem as restrições que limitam o nosso leque de opções e condicionarão a nossa ação.

Mas quero que o País saiba que o Governo que hoje aqui toma posse não é um Governo temeroso do futuro, angustiado com o peso das suas competências ou preso de movimentos ante a dimensão das suas tarefas. Que não fique a mínima dúvida: este é um governo confiante. Confiante, antes de mais, no seu projeto mobilizador do País e na solidariedade da maioria parlamentar que lhe manifestou apoio e lhe confere inteira legitimidade.

O resultado das eleições legislativas do passado dia 4 de outubro confronta todos os agentes políticos com uma dupla responsabilidade.

Por um lado, a todos exige um esforço adicional de diálogo e compromisso, de modo a que seja possível assegurar um governo coerente, estável e duradouro.
Por outro lado, o respeito do sentido claro da votação popular exige que o Governo assuma como sua linha de orientação a mudança das políticas, dando prioridade ao crescimento económico, à criação de emprego, à redução das desigualdades, assim permitindo em bases mais sãs e sustentáveis a consolidação orçamental e o equilíbrio das contas públicas.

O Governo que hoje aqui se apresenta está precisamente à altura dessa dupla responsabilidade: por um lado, é fruto de um compromisso político maioritário alcançado no novo quadro parlamentar, correspondendo assim à vontade genuinamente democrática que se expressa no Parlamento diretamente eleito pelos cidadãos; por outro lado, perfilha um programa claramente apostado no virar de página da austeridade, e orientado para mobilizar Portugal e os Portugueses num triplo propósito: mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade.

Vale a pena lembrar que o Parlamento livremente eleito pelo povo é tão plural quanto quem o escolheu. Da mesma maneira que numa eleição todos os votos contam, também contam todos os mandatos parlamentares, quer para efeito de representação, quer para efeito de governação. A democracia portuguesa ficou demasiado tempo refém de exclusões de facto, que limitavam o leque de soluções políticas possíveis e defraudavam o sentido do voto de boa parte dos nossos concidadãos.

A solução politica que viabiliza este Governo valoriza o pluralismo parlamentar, diversifica as alternativas ao dispor dos portugueses e por isso enriquece a nossa democracia.

O Governo provém da Assembleia da República - e é perante a Assembleia que responde politicamente. É preciso, por isso, que a formação e a orientação programática do Governo respeitem a sua composição e realizem os compromissos que essa composição ao mesmo tempo exige e permite.

Com a entrada em funções deste Governo, termina um momento político, certamente complexo e delicado, mas inteiramente normal numa democracia parlamentar. Através de um processo de diálogo político transparente e democrático, formou-se uma maioria estável que assegura, na perspetiva da legislatura, o suporte parlamentar duradouro a um Governo coerente.

Hoje empossado por Vossa Excelência, senhor Presidente, o XXI Governo Constitucional torna-se o Governo de Portugal.

É agora tempo de assumirmos todos, por inteiro, as nossas responsabilidades, o que quer dizer, no que respeita ao Governo, a máxima lealdade e cooperação institucional com o Presidente da República, no respeito escrupuloso pelas competências próprias do Presidente da República, do Parlamento e do poder judicial, no apreço pelas autonomias regionais e o poder local, na cultura do diálogo e da concertação social, na modernização e dignificação da administração pública, na transparência e prestação de contas face ao conjunto dos cidadãos.

Este é um Governo de garantia.

Da garantia fundamental e primeira de um Estado de Direito Democrático, o respeito pela nossa lei fundamental, a Constituição da República Portuguesa.

Da garantia da continuidade do Estado nos seus compromissos internacionais e no quadro da União Europeia.

Da garantia da estabilidade do quadro das opções estratégicas que a geografia, a história e a vontade soberana do povo português definiram como o novo lugar que o 25 de Abril abriu ao Portugal democrático.
O lugar de Portugal na União Europeia e na zona euro. O lugar de Portugal na Comunidade de Países de Língua Portuguesa. O lugar de Portugal na grande ligação atlântica, incluindo na Organização do Tratado do Atlântico Norte. O lugar de Portugal na comunidade internacional, no sistema das Nações Unidas e demais organizações multilaterais. Portugal afirma-se em todos estes domínios através das comunidades portuguesas espalhadas pelo Mundo, da qualidade da sua diplomacia, bem como na cooperação para o desenvolvimento e na segurança cooperativa, designadamente através das Forças Armadas.

Todos sabemos que o País atravessou momentos muito duros ao longo destes últimos anos. Ninguém tenha dúvidas, o trajeto que seguimos deixará marcas, e marcas profundas, ainda por muito tempo. Alguns dirão que tinha de ser, outros dizem que havia alternativas. Por mim, confio à História esse debate, porque julgo ser meu dever e dever do Governo que lidero, centrar-se no que lhe é exigido hoje para construirmos o futuro.
Mas o que em qualquer caso não podemos ignorar é que, infelizmente, e depois de tantos sacrifícios, a nossa sociedade está hoje mais pobre e desigual a nossa economia mais enfraquecida no seu potencial de crescimento e o País mais endividado.

O aumento e proteção do rendimento disponível das famílias, o alívio da asfixia fiscal da classe média, o desendividamento e condições de investimento das empresas, o combate à pobreza, a garantia de serviços e bens públicos essenciais são necessidades do tempo da urgência social e económica, condição de relançamento da economia e da criação de emprego.

Mas a satisfação das necessidades do País não se basta neste tempo da urgência, antes exigindo a continuidade que permite enfrentar os bloqueios estruturais à competitividade, que tanto têm dificultado a adaptação da economia nacional ao novo quadro resultante da globalização, do alargamento da UE e da participação no euro.

Como comprovámos dolorosamente, não recuperamos competitividade por via do empobrecimento coletivo, da precarização do trabalho ou do sacrifício da qualidade e proximidade de serviços públicos. A austeridade não gera crescimento, nem a desvalorização interna prosperidade.

As reformas que temos de fazer são outras e exigem persistência e continuidade no investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da administração pública, na valorização do território e dos seus recursos, na promoção da saúde, no reforço da coesão e na redução das desigualdades.

Só assim será duradouramente sustentável um novo impulso para a convergência com a União Europeia e o objetivo essencial de qualquer boa governação de assegurar finanças públicas equilibradas, que este Governo prosseguirá através da exigente trajetória de redução do défice orçamental e da dívida pública no ciclo desta Legislatura.

Esta é matéria para a discussão do Programa do Governo que faremos no órgão de soberania que detém a competência exclusiva para a sua apreciação - a Assembleia da República.
Mas a estrutura do Governo hoje empossado é também expressão desta visão estratégica.

Daí a centralidade atribuída à Cultura, à Ciência e à Educação como pilares da sociedade do Conhecimento. Ou à política do Mar, esse enorme manancial de recursos que o País tarda em valorizar devidamente. Ou a dimensão transversal da Modernização Administrativa, fator-chave de desenvolvimento.


Este Governo nasceu da recusa da ideia de que não haveria alternativa à política que vem sendo prosseguida e a sua posse por V. Exa. é a prova que a democracia gera sempre alternativas.

Não viemos, portanto, nem com uma atitude de resignação ante as pretensas fatalidades do destino - seja o destino nacional, seja o destino do projeto europeu -, nem para trazer aos portugueses, e sobretudo aos jovens portugueses, palavras inaceitáveis de demissão e desistência, como se não restasse aos nossos jovens qualquer alternativa senão ir procurar lá fora os sonhos que, sabe-se lá porquê, aqui seria impossível cumprir.

O espírito que anima este Governo é outro - e bem diferente. O que desejamos é construir aqui, passo a passo, projeto a projeto, medida a medida, um tempo novo para Portugal e para os portugueses.

Um tempo novo - é essa, verdadeiramente, a nossa ambição.

Um tempo novo para a vida das famílias, dos trabalhadores e das empresas; um tempo novo para a economia e para o emprego; um tempo novo para o Estado e para os serviços públicos; um tempo novo para o combate à pobreza e às desigualdades; um tempo novo para a aposta nas chaves do futuro - a Ciência, a Educação e a Cultura; um tempo novo, enfim, de oportunidades e de esperança, que assinale, de uma vez por todas, o reencontro das prioridades da governação com os projetos de vida dos portugueses que têm direito a ser felizes aqui.

Houve ao longo deste tempo - fruto de diversas contingências, mas também por força de um certo discurso político sobre os nossos problemas e a natureza da crise que atravessámos - uma grave degradação dos valores e dos laços que unem a comunidade nacional e que são imprescindíveis para fazer de nós uma sociedade coesa e solidária.
São falsas, demagógicas e perigosas as dicotomias simplistas que pretendem pôr em confronto os interesses e os direitos de jovens e velhos; de activos e pensionistas; de empregados e desempregados; de trabalhadores do sector público e trabalhadores do sector privado. Tal como são inaceitáveis, erradas e, além do mais, inconstitucionais, as pretensões que pretendem pôr em causa os alicerces em que assenta o nosso contrato social, tornado possível pelo regime democrático, e que garante a solidariedade entre as gerações, em particular no sistema público de segurança social, ao mesmo tempo que proporciona o acesso de todos aos serviços públicos, sem os quais não poderá haver uma sociedade mais justa.

Para acudir aos verdadeiros problemas, todas as Portuguesas e todos os Portugueses são necessários. Ninguém é dispensável. Pelo diálogo, pela concertação e pelo compromisso, temos de chegar, a partir dos interesses legítimos das partes, a uma plataforma comum de vontade e mobilização.

Este é, portanto, o tempo da reunião. Não é de crispação que Portugal carece, mas sim de serenidade. Não é altura de salgar as feridas, mas sim de sará-las. O bom conselheiro desta hora não é o despeito ou o desforço, mas a determinação em mobilizar as vontades para vencermos os desafios que temos pela frente.

Não progrediremos com radicalizações. A conduta do XXI Governo pautar-se-á, pois, pela moderação. Moderado será o seu programa, realizando uma alternativa à vertigem austeritária, que só agravou os problemas económicos, sociais e mesmo orçamentais; mas será uma alternativa realista, cuidadosa e prudente. E moderada será a sua atitude.

Senhor Presidente
Minhas Senhoras e meus Senhores
Permitam-me, ainda, duas palavras antes de concluir.

A primeira, para dirigir uma cordial saudação democrática ao Primeiro-Ministro cessante, Dr. Pedro Passos Coelho, e a toda a sua equipa. As nossas divergências políticas, naturais e até salutares em democracia, que são bem conhecidas, não me impedem de prestar aqui público reconhecimento à dedicação e esforço empenhados pelo Primeiro-Ministro cessante na sua ação governativa, num período tão crítico e de grandes dificuldades, em prol da sua convicção do interesse nacional.

Uma palavra, também, de sentido agradecimento a todos aqueles, mulheres e homens, que, de forma tão generosa, aceitaram o meu convite para integrarem este XXI Governo Constitucional.

Foi para um projeto entusiasmante que vos convidei. E é com a vossa dedicação e o vosso entusiasmo que conto, para que o XXI Governo ajude Portugal a triunfar nos desafios do século XXI.

É para servir Portugal que aqui estamos. Essa, aliás, é mesmo a nossa única razão de ser: Portugal.»

(*Já disponível no sítio do Governo de Portugal)

"Eu é que sou o presidente da junta"!*

«O Governo que hoje toma posse foi formado na sequência da crise política aberta pela rejeição do Programa do XX Governo Constitucional. Nos termos da Constituição, tal implicou automaticamente a sua demissão, ficando o Executivo limitado à prática dos atos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.

Ao Primeiro-Ministro cessante, que chefiou o Governo de Portugal durante mais de quatro anos, bem como aos membros dos seus governos, expresso público reconhecimento pelos serviços prestados ao País em circunstâncias muito difíceis, e desejo os maiores sucessos pessoais e profissionais.

Em resultado da demissão do Governo, e tendo presente que se vive um tempo em que o Presidente da República não dispõe da faculdade de dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, decidi auscultar a opinião dos parceiros sociais e de instituições e personalidades da nossa vida pública conhecedoras da realidade económica, social e financeira do País.

Nessas audiências, obtive informações relevantes sobre as opções de política económica que devem ser seguidas em ordem a preservar a trajetória de crescimento e de criação de emprego, a estabilidade do sistema financeiro e o financiamento do Estado e da economia, assim como sobre a importância do cumprimento das regras de disciplina orçamental e de sustentabilidade da dívida pública.

Entretanto, quatro forças políticas assinaram três documentos de diferente alcance, designados “posições conjuntas”, com vista à apresentação de uma solução governativa alternativa.

Os referidos documentos são omissos quanto a alguns pontos essenciais à estabilidade política e à durabilidade do Governo, suscitando questões que, apesar dos esforços desenvolvidos, não foram totalmente dissipadas.

Trata-se de uma solução inédita na história da nossa democracia, suportada por uma maioria parlamentar que se comprometeu a não inviabilizar a entrada em funções de um novo Executivo, o que confere às forças políticas envolvidas a responsabilidade pelo Governo que hoje é empossado.

Senhoras e Senhores,

A entrada em funções do XXI Governo Constitucional inicia um novo ciclo político.

No entanto, os objetivos estratégicos do País permanecem. Como afirmei no passado dia 30 de outubro, «o superior interesse nacional é muito claro: devemos consolidar a trajetória de crescimento económico e preservar a credibilidade externa. Não podemos regredir num caminho que foi árduo, em que foram pedidos muitos sacrifícios aos Portugueses.»

Nesse sentido, e como referi então, e cito «exige-se ao Governo que agora toma posse que respeite as regras europeias de disciplina orçamental aplicáveis aos países da Zona Euro e subscritos pelo Estado português, nomeadamente o Pacto de Estabilidade e Crescimento e o Tratado Orçamental, de modo a que Portugal saia rapidamente do Procedimento por Défice Excessivo, reduza o rácio da dívida pública e alcance o objetivo de médio prazo fixado para o défice estrutural.»

Trata-se de compromissos de Estado que a Assembleia da República sufragou por esmagadora maioria.

No momento histórico que atravessamos, é uma ilusão pensar que um país como Portugal pode prescindir da confiança dos mercados financeiros e dos investidores externos e, bem assim, do apoio de instituições internacionais.

Importa, a este propósito, ter presente algumas verdades elementares de política económica que, por serem lembradas por entidades independentes e credíveis, um Governo não pode deixar de ter em conta.

Já este mês, a OCDE, referindo-se às perspetivas económicas para Portugal, afirmou: «o não cumprimento dos objetivos orçamentais afeta negativamente a confiança e aumenta os juros dos empréstimos».

Por outro lado, no seu último relatório, o Conselho de Finanças Públicas advertiu, e cito: «o País precisa de um modelo de crescimento estável da economia e do emprego, assente no aumento da produtividade e na competitividade da economia e não no seu endividamento e no aumento das despesas públicas».

Referindo-se a uma política que pusesse em causa as medidas necessárias para sair do Procedimento por Défices Excessivos a que Portugal ainda se encontra sujeito, o Conselho de Finanças Públicas acrescenta que o impacto de uma política em que o crescimento seria impulsionado pelo consumo privado e pela quebra da poupança seria insustentável, em resultado do aumento das importações e da deterioração do saldo das contas externas.

O Conselho de Finanças Públicas deixa ainda, no seu recente Relatório, um aviso muito sério: «uma política virada para o curto prazo e assente num grau minimalista de consolidação orçamental não só não cumpriria as atuais regras europeias como teria implicações negativas sobre o endividamento do País e a produtividade».

Na mesma linha, o Banco de Portugal, no seu Boletim Económico de outubro de 2015, afirma, de forma inequívoca: «O cumprimento dos compromissos das autoridades nacionais no âmbito das regras orçamentais europeias é essencial para assegurar a redução do nível da dívida pública em percentagem do PIB, que constitui uma vulnerabilidade latente da economia portuguesa».

Há que prestar uma atenção particular à defesa da estabilidade do sistema financeiro, dado o seu papel fulcral no financiamento da economia portuguesa. Há que estimular e respeitar os nossos empresários e trabalhadores, verdadeiros heróis do aumento da atividade exportadora. Há que combater o desemprego através do crescimento da economia.

É neste quadro de grande responsabilidade que o novo Executivo inicia funções.

Perante os desafios que tem pela frente, podem contar, este Governo e o seu Primeiro-Ministro, com a lealdade institucional do Presidente da República para a salvaguarda dos superiores interesses nacionais.

Não abdicando de nenhum dos poderes que a Constituição atribui ao Presidente da República – e recordo que desses poderes só o de dissolução parlamentar se encontra cerceado – e com a legitimidade própria que advém de ter sido eleito por sufrágio universal e direto dos Portugueses, tudo farei para que o País não se afaste da atual trajetória de crescimento económico e criação de emprego e preserve a credibilidade externa.

Sendo o Governo minoritário, e não resultando inteiramente claro dos documentos assinados entre os partidos a garantia de durabilidade no horizonte temporal da legislatura, a tomada de posse e entrada em funções do novo Executivo constitui uma prova para a capacidade de diálogo não só com as demais forças políticas mas também com os parceiros sociais e as instituições da sociedade civil.

É fundamental que a concertação social seja valorizada enquanto elemento decisivo para o desenvolvimento do País e para a coesão da sociedade portuguesa. Esvaziar o papel dos parceiros sociais teria um custo muito elevado para o nosso futuro.

Desejo a Vossa Excelência, Senhor Primeiro-Ministro, e aos membros do XXI Governo Constitucional, os maiores sucessos nas exigentes funções que agora iniciam.

Muito obrigado.»

(* Discurso de Cavaco na tomada de posse do XXI Governo Constitucional)