domingo, 23 de maio de 2010

"Os malandros"

O diagnóstico sobre as actuais dificuldades de financiamento está feito, não havendo grandes dúvidas sobre o facto de que tais dificuldades resultam do elevado endividamento da economia portuguesa, face ao exterior.
 Constata-se, porém, face aos dados disponíveis, que, ao contrário do que tantas vezes se diz, não é o Estado o principal  responsável pela situação. De facto, como aqui se salienta, as dificuldades não resultam tanto "do défice público, que está abaixo do do Reino Unido, por exemplo, ou da dívida do Estado, que fica muito longe da da Bélgica". E também não é verdade que, como tantos se esforçam por fazer crer, que o "culpado" seja Sócrates, pois o problema já vem de há muito. Vem, pelo menos, desde os tempos de Cavaco Silva, o "pai do monstro" por via do "Novo Sistema Retributivo da Função Pública, que na década seguinte implicou um crescimento na ordem dos dez por cento ao ano dos custos do pessoal do Estado". Aliás, José Sócrates, que pode invocar a seu favor a redução do défice público para 2,6%, nos primeiros anos da sua governação e  a realização de várias reformas para domar "o monstro", no âmbito da segurança social e no domínio da Administração Pública, só não pode reclamar-se de completamente inocente por, em ano eleitoral, ter cedido ao eleitoralismo, ao aprovar o aumento dos salários dos funcionários públicos em 2,9%, aumento que somado ao reforço dos apoios sociais (estes inteiramente justificados pela crise) fizeram disparar o défice para os 9,3%.
Usando uma terminologia intencionalmente desculpabilizante, diz-se com frequência que as dificuldades derivam da fraca produtividade geral da nossa economia. É verdade que sim. Só que não é a verdade toda, porque o problema não existiria se o que consumimos não excedesse o que produzimos. Ora,  sabe-se que o valor do consumo excede em mais de 10%  o valor do produto. Em termos nus e crus, isto quer dizer que vivemos há muito, "muito acima das nossas possibilidades".
Pondo de parte os que vivem em situação de pobreza, é evidente  que a responsabilidade é colectiva. É dos produtores e é dos consumidores. Somos todos, afinal, responsáveis, embora em graus diferentes, como é óbvio.
E, todavia, quem é  assume a sua quota de responsabilidade? Não é, por certo, o empresário que, por muitas dificuldades que se vivam na empresa, não dispensa os gastos para fins de ostentação pessoal, nem o consumista sobreendividado que não dispensa as férias nas Caraíbas, mesmo que tenha que recorrer ao crédito que lhe vai custar os olhos da cara. Um e outro mais depressa lançam as culpas para cima dos "malandros do Governo".
E, como estes, muitos outros, pois ninguém sente constrangimento em tirar a água para fora do capote, mesmo que, entretanto,  já se tenha mudado de indumentária, como é o caso dos vários ex-ministros das Finanças em recente romagem a Belém e até de Cavaco Silva que, por muitos apelos que agora faça, nunca vi assumir as responsabilidades que lhe cabem enquanto primeiro-ministro.
O estimado leitor já viu ?

3 comentários:

Ana Paula Fitas disse...

Caro Francisco,
Fiz link :)
Obrigado.
Um abraço.

Francisco Clamote disse...

Eu é que tenho que agradecer, Ana Paula. Abraço.

Carta a Garcia disse...

Caro Francisco Clamote,
Fiz link para "A Carta a Garcia".Obrigado,
Abraço,
OC