"Uma década perdida!, exclamava-se há dois anos. O novo sebastianismo tinha no PSD o seu porta-estandarte: o horror, o horror! – Portugal era um projecto falhado, uma nação falida.
Só uma nova moral nos salvaria: promover a credibilidade internacional; domar o Estado, de preferência à bruta; e competir em saldos. Eram estes os três capítulos para um novo génesis.
Um cardápio assim estruturado negava evidências. Nos dez anos anteriores à crise, Portugal diversificou a cartografia das exportações. A ciência internacionalizou-se. Inovou em mercados emergentes como os da mobilidade eléctrica e das energias renováveis. Os seus alunos revelaram progressos extraordinários em testes internacionais de aferição. A produção cultural expandiu-se. A reforma da segurança social de 2006 foi exemplar na concertação. E a estrutura de qualificações de base dos portugueses alterou-se significativamente.
Este ajustamento sustentado foi entretanto substituído por um ajustamento delirante que até à saída da ‘troika' poderá criar 600 mil novos desempregados, metade deles de longa duração. Novos desempregados esses embebidos numa economia amorfa que perdeu o seu principal qualificativo: inovadora.
Em 2014, Portugal ficará próximo de um diagnóstico de transtorno de stress pós-traumático. Politicamente, alternará entre a negação do acontecimento e a possibilidade compulsiva da sua repetição. A tristeza, a culpa e o medo dominarão o debate num espectro político que se fragmentou excessivamente e assim se manterá por muitos anos.
Um espectro sem densidade crítica para se comprometer com uma agenda de crescimento sustentado e solidário. Uma agenda de inovação tecnológica, de competitividade e de internacionalização. Mas também uma agenda de solidariedade entre classes e gerações que permita diminuir desigualdades.
Nos próximos anos, estaremos de tal forma fragmentados e escangalhados que não haverá nenhum projecto colectivo e mobilizador. Aí, sim, poderemos falar de uma década perdida. Esta."
1 comentário:
Esta não lhe faz lembrar a do "Solitário"? O espanhol ou o português, tanto faz. Qualquer deles passou uma década feliz a assaltar bancos ... e outra década perdida na cadeia, coitados!...
José Correia
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