É um lugar comum afirmar que a Justiça é cega, mas, de facto, a asserção tem tanto de comum como de falsa. E nem é preciso fazer grandes indagações para concluir pela sua falsidade. Basta atentar na forma como foram (estão) a ser tratados dois arguidos considerados mediáticos: o ex-primeiro-ministro do Governo anterior (José Sócrates) e o um ex-ministro do actual governo (Miguel Macedo)
O contraste entre o modo como foram tratados, enquanto arguidos, um e outro chega a ser chocante.
Conhecem-se os tratos de polé a que José Sócrates tem sido sujeito pelos agentes da justiça responsáveis pelo respectivo processo, desde o primeiro momento que coincide com a sua prisão previamente anunciada a alguma comunicação social, dando oportunidade para a prática do primeiro de muitos actos que tiveram como fito principal o achincalhamento do detido
Veja-se, para estabelecer uma comparação, a forma como o Público retrata o tratamento dado ao ex-ministro Miguel Macedo:
« O ex-ministro da Administração Interna Miguel Macedo foi esta terça-feira interrogado durante seis horas como arguido no processo dos vistos gold, no âmbito do qual é suspeito de três crimes prevaricação de titular de cargo político e de um crime de tráfico de influências. O interrogatório ao deputado social-democrata começou pelas 15h e foi interrompido pelas 21h. Miguel Macedo terá de regressar para a continuação do interrogatório “em data a designar”, informou a Procuradoria-Geral da República (PGR) ao início da noite desta terça-feira, confirmando também o estatuto de “arguido” do deputado.
(...)
A audição de Miguel Macedo não decorreu no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) como seria normal. A procuradora Susana Figueiredo, titular deste inquérito, realizou o interrogatório no edifício do Gabinete de Documentação e de Direito Comparado da PGR a poucos metros do edifício do DCIAP. Com esta manobra, o MP trocou as voltas aos jornalistas que aguardavam Miguel Macedo, ao início da tarde desta terça-feira, à porta do DCIAP. Quando a comunicação social soube o local onde de facto ocorreria a audição, já Macedo tinha entrado, acompanhado pelo advogado Alfredo Castanheira Neves.
Também só depois das 15h, quando já decorria a audição, é que a PGR confirmou às redacções a realização do interrogatório. “Confirma-se que Miguel Macedo é ouvido hoje pelo Ministério Público, no âmbito do inquérito onde se investigam, entre outras, matérias relacionadas com a atribuição de vistos gold”, disse então a procuradoria. »
Não pretendo com este arrazoado e com a transcrição supra, censurar o procedimento da procuradora Susana Figueiredo, que me parece inteiramente correcto e que poderia até servir de exemplo para outros colegas de magistratura, nem a questionar, por um só momento que seja, a inocência de Miguel Macedo. Não só a presumo, como atesto que este tem agido, a meu ver, sem falhas a apontar, desde que surgiu o caso dos vistos gold.
O que me parece inquestionável resultar da comparação é a confirmação de que a justiça, entendida esta como instituição servida por gente boa e menos boa, decente e menos decente, independente e menos independente, recta e menos recta, proba e menos proba, nunca foi, nem é, cega.
Como digo, não é preciso recuar muito no tempo (e não faltariam casos para apreciar) para se chegar a essa conclusão.
2 comentários:
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~ Muito bem interpretado e ajuizado.
~ Excelente, Francisco.
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Pois é... les uns et les autres.... É que o «formigo» pertence à área de proteção do Padrinho, por isso...
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