É normal que qualquer nova liderança partidária procure conformar o partido com as suas ideias e que introduza alterações na linha política até então seguida. É dos livros. Todavia, a nova direcção do PSD, liderada por Pedro Passos Coelho, está, a meu ver, a provocar uma autêntica ruptura em relação ao passado, ruptura que vai no sentido de descaracterizar profundamente o partido.
Sabe-se que o PPD/PSD nunca foi um partido muito marcado ideologicamente, mas suponho não andar longe da verdade se disser que nele prevalecia uma corrente com preocupações sociais, alinhada com a doutrina social da Igreja, entidade à qual a maioria dos seus líderes estava ligada, efectiva ou afectivamente. Sá Carneiro, Sousa Franco, Cavaco Silva, Marcelo Rebelo de Sousa, são bons exemplos, para além de outros menos ostensivos. Julgo, aliás, que era essa orientação que, de alguma forma, legitimava o uso do qualificativo "social-democrata" apenso à designação do partido.
Pesem embora as contradições do discurso do novo líder, que ora vira o prego ao bico, ora o bico ao prego, parece manifesto que a preocupação ora prevalecente vai no sentido da defesa do "mercado", na linha dum neo-liberalismo pouco (ou nada) preocupado com as consequências que essa orientação política possa ter no plano social, designadamente, em matérias como a saúde, a educação e as prestações sociais. É, salvo erro, o que decorre das pretensões do partido em sede de revisão constitucional e esta é, pelo menos, a leitura que geralmente tem sido feita. Se erro, seguramente, não estou sozinho.
Os factos, porém, confirmam a leitura, muito para além das declarações e das propostas.
Tomemos como exemplo a posição defendida pela liderança do PSD em relação ao veto do Governo à compra da VIVO pela espanhola TELEFÓNICA, no uso dos poderes conferidos pelas acções preferenciais detidas pelo Estado. Dizem eles, Pedro Passos Coelho (presidente) e Miguel Relvas (secretário-geral) que o negócio era mau para a PT e, logo, contra o interesse do país. No entanto, declaram-se contra o uso do veto, em nome da vontade da maioria dos accionistas e das regras do mercado.
Dou de barato o quanto esta posição está nos antípodas das posições de anteriores direcções do partido, que não só criaram as acções preferenciais, como as mantiveram, quando o Governo era liderado pelo PSD. Dou de barato, mas vejo aqui mais uma prova de ruptura com o passado a que acima aludo. O que me interessa salientar é que, para esta liderança do PSD, mesmo o interesse nacional tem que ceder perante o "sacrossanto mercado". Se isto não é liberalismo puro e duro é o quê ?
É também a refundação de um partido a que agora se acolhe, de bom grado, boa parte da direita que votava CDS/PP e que já estará em debandada, a crer nas últimas sondagens.
Que esta direita já se deu conta da refundação do PSD, parece-me óbvio. Pergunto-me é se a nova liderança já terá avisado os próprios militantes. Pelas mesmas sondagens, diria que não.
1 comentário:
Caro F. Clamote,
Fiz link para A Carta a Garcia.
Obrigado,
Cumprimentos,
OC
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