(Foto Miguel Manso / Público)
Surpresas é algo que não tem faltado no processo desencadeado na sequência da renúncia à recandidatura à liderança do PSD anunciada por Passos Coelho, no dia posterior às eleições autárquicas, numa atitude que se louva, embora, manifestamente, tal anúncio não fosse minimamente expectável face a declarações feitas anteriormente pelo mesmo Passos Coelho. A renúncia à recandidatura constitui, pois, ela própria, uma surpresa. A primeira, por sinal, mas, passe o pleonasmo, não tão surpreendente assim, visto que o vezo de Passos Coelho em dar o dito pelo não dito já vem de longe. Diria mesmo que tal comportamento faz, desde sempre, parte da sua idiossincrasia como político.
Mas surpresas, e de tomo, continuam a surgir em catadupa. Desde logo as desistências de personalidades apontadas como favoritas a substituir Passos Coelho, como Luís Montenegro, primeiro e Paulo Rangel, depois. Sobre as razões invocadas por um e por outro, já me pronunciei
noutro post e não tenho razões que me levem a rever a opinião então manifestada. Muito pelo contrário. A leitura de alguma imprensa de fim de semana só contribuiu para cimentar a ideia de que a decisão de qualquer deles baseou-se tão só em calculismo e numa grande dose de cinismo.
A meu ver, o PSD não perdeu nada com tais desistências e o país muito menos. Não percamos, pois mais tempo com tão fracas figuras, porque, ou eu me engano muito, ou qualquer deles passou à história com letra pequena. Isto, claro, se no PSD ainda restar alguma capacidade de memória e noção de dignidade, como suponho.
Para variar, há que reconhecer que surpresa não será a candidatura de Rui Rio, candidatura há muito falada e que,
ao que dizem as crónicas, vai ser anunciada formalmente em Aveiro na próxima quarta-feira. Que assim seja!
De surpresa poderá voltar a falar-se, se a candidatura de Pedro Santana Lopes avançar, hipótese que, ao que garante o comentador televiso agora frequentemente apelidado de "bruxo de Fafe", continua em cima da mesa e que, a concretizar-se, trará algum colorido à disputa. As hipóteses de êxito de Santana Lopes, face a Rui Rio, parecem francamente diminutas. Ou, porventura, nenhumas, se estiver certo o dito segundo o qual "a mesma água nunca passa duas vezes por baixo da mesma ponte". Considerações desta natureza não serão, porém, suficientes, nem de molde a esmorecer a vontade de Santana Lopes em se candidatar, se sentir que continua a ter algum apoio nas bases, como parece ser o caso, porque Pedro Santana Lopes é um D. Quixote com sotaque português, para quem não há impossíveis.
Outra eventual surpresa seria a confirmação como candidato de um ilustre desconhecido que ultimamente tem vindo a ser falado por diversas personalidades do partido, que responde pelo nome de Miguel Pinto Luz. Que seja!
A grande surpresa, porém, a que assume a natureza de autêntico escândalo reside no facto de nenhuma figura das mais gradas pertencentes ao círculo dos colaboradores próximos de Passos Coelho se ter mostrado disposta a defender o legado político de Pedro Passos Coelho, que, estando de partida é, no entanto, um líder que só deixará de o ser por sua única e exclusiva vontade, ainda que pressionado pelas circunstâncias, como é evidente.
Não tenho por Passos Coelho (e nunca o escondi) nenhuma consideração, nem como político, nem sequer (ai de mim!) como pessoa. Também não considero que o seu legado, se algum deixa, mereça ser preservado. Isto, porém, é o que eu penso. Bem diferente teria de ser, como é óbvio, o entendimento dos que ao longo de mais de seis anos, no governo ou na oposição, passaram o tempo a exaltar a política de austeridade "custe o que custar" e medidas como a da redução do peso do Estado na economia, com a venda a pataco de tudo quanto era empresa pública; ou as que se traduziram em cortes de subsídios de férias, de salários da função pública e de pensões; ou na desvalorização do salários dos trabalhadores do sector privado e na precarização do trabalho assalariado. Etc. etc. etc. Esta política e estas medidas eram aplaudidas entusiasticamente por todos quantos volteavam em redor de Passos Coelho.
Como se compreende, pois, que entre tanta gente, não apareça, agora, ninguém disposto a defender, desde logo na arena partidária, a excelência de tal política?
Será que, como Saulo de Tarso, caíram subitamente do cavalo e viram finalmente a luz? Como não acredito em milagres, as explicações continuam por aparecer e não há dúvida de que os esclarecimentos em falta deveriam de partir de pessoas com especiais responsabilidades durante o passismo, como Maria Luís Albuquerque (na imagem supra), apontada, durante muito tempo, como sucessora natural de Passos Coelho, ou Marco António Costa (na imagem infra) o "dono" da máquina do partido, durante todo o longo período da governação passista.
De Maria Luís Albuquerque não se ouviu, até agora, nem um sussurro, o que é estranho tratando-se de pessoa sempre pronta a dar a sua opinião sobre tudo e sobre nada.
Marco António Costa, sim, falou em entrevista dada ao "Expresso". Falou e disse coisas de espantar. Por exemplo, fica-se a saber que Luís Montenegro terá desistido de se candidatar, porque, lê-se no "Expresso", "estava demasiado colado a Passos". Tal como ele próprio, Marco António: "Ambos carregamos o facto (sic) de termos dado muito a cara no período difícil da governação".
Marco António Costa é, pois, claro. A explicação para o comportamento dos colaboradores e, até há poucos dias, admiradores entusiásticos de Pedro Passos Coelho, de repente apenas empenhados em marcar distâncias em relação ao seu ainda líder, é, afinal, simples:
Passos Coelho, sem poder, tem lepra.
Como foi possível que a governação do país tivesse estado, durante toda uma longuíssima legislatura, entregue a gente desta ?
(FotoNuno Ferreira Santos / Publico)
(Reeditado)