domingo, 17 de maio de 2009

Citações # 35

"O melhor trabalho jornalístico português que vi nos últimos tempos, em todas as categorias, foi o do fotógrafo chinês Zhang Xiao Dong. Aconteceu ontem, no Expresso. A reportagem escrita esteve cargo de um bom repórter, Rui Gustavo, que foi à China encontrar o primo de Sócrates. O primo nada disse com interesse, porque o que teria interesse seria ele a comprometer o primo.
O que interessa - vou dar um exemplo para os leitores distraídos perceberem o que é hoje interesse jornalístico - seria Sócrates dizer no meio de uma viagem de Estado: "Vim à Capadócia porque era há muito um sonho da minha namorada vir à Capadócia." Como Sócrates não disse isso, esta frase não abriu telejornais. Talvez alguém tenha dito uma parecida, mas também não abriu telejornais, pois não? Sorte de quem tenha dito essa frase similar e possa - e ainda bem que pode - dizê-la sem escândalo
.
(...)
Ontem, no Expresso - desde a capa, com a foto do primo de Sócrates, lutador de kung fu, em cima de pilares, à dele rezando no templo de Shaolin - vi esse humilde ofício de jornalismo, contando, não aldrabando. Leitor de jornais, senti-me lavado. Ah, se só se contassem histórias e o jornalismo não fosse instrumento de sei lá o quê... "
Ferreira Fernandes - "Sócrates, o primo e a Capadócia"
(O omitido pode ser lido aqui)

2 comentários:

Anónimo disse...

é deplorável que assim seja, mas é.

Anónimo disse...

Boa.

Gostei que tivesse transcrito o quase sibilino artigo e neste "quase", por isso mesmo, profundamente irónico, sobre o tratamento jornalístico dado aos envolvidos.

Neste pequeno púlpito da informação/formação ( cujo ícon tem brilhado nos últimos dias - será sinal de ter atingido picos notáveis?), se me permite, também ficaria bem, a referência e divulgação do demolidor artigo, hoje no "Público", de António Barreto- "A culpa é sempre dos outros".

E, por falar em culpa, o jornalismo também é culpado pelo estado da justiça em Portugal, pois que, se usasse dos mesmos métodos que, em geral, vem recorrendo quanto aos casos mediáticos como o Freeport, designadamente, dando voz aos protestos e aos imensos casos da justiça em Portugal, talvez que, quem tem tido poder para fazer algo, se sentisse mal e tivesse feito algo para inverter a marcha das coisas e ordenar o caos.

Se assim fora, bem se desculparia algum maquiavelismo utilizado.

Bem-haja e os meus melhores cumprimentos.