quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

O veto presidencial e o enfiar da carapuça

O Presidente da República (PR) vetou a alteração aprovada na Assembleia da República relativa à Lei Eleitoral, alteração através da qual se punha termo ao voto por correspondência dos emigrantes, nas eleições legislativas.
A argumentação aduzida pelo PR, no sentido de que a alteração iria promover a abstenção eleitoral é demasiado fraca para justificar a decisão, até porque a favor da alteração apontavam razões de fundo e bem mais consistentes como é o facto de o voto por correspondência não assegurar a genuinidade do voto, facto que, só por si, justificaria a decisão no sentido da promulgação.
Adiante-se que, por alguma razão, o voto por correspondência já não é admitido nas eleições presidenciais, nem nas eleições para o Parlamento Europeu. Será, pergunta-se, que as eleições legislativas têm menos importância que aquelas outras, justificando-se nas eleições legislativas menos rigor na preservação da genuinidade do voto do que nas outras ? A pergunta é puramente retórica, pois é evidente que não.
Importa, no entanto, acrescentar que a argumentação presidencial, além de fraca, é ridícula. Para tal concluir, basta que se atente no facto inegável de que a abstenção entre os emigrantes atinge já, actualmente, valores elevadíssimos. Ora, se a manutenção do voto por correspondência não impediu, no passado, esse resultado, é legítimo prever que o mesmo sistema de votação não vai impedir que a abstenção se mantenha nos actuais níveis ou que se venha mesmo a acentuar no futuro, como é o mais provável. O futuro se encarregará de no-lo dizer.
As razões do veto têm pois que ir buscar-se a outro lado e talvez não dê para errar muito se se vir nessa decisão o resultado de pressões por parte do PSD que, como é sabido, se mostrou adversário acérrimo da alteração e tudo fez para que ela não fosse avante. Suponho que eles devem saber porquê.
Seja como for, uma coisa é certa. O PR ao vetar a alteração aprovada pela Assembleia da República, pela maioria dos deputados e pela maioria dos partidos ali representados, torna-se responsável pela manutenção da actual lei que, no aspecto aqui considerado, é, a meu ver, uma má lei.
Este caso serve, aliás, para lembrar que o PR é o principal responsável pelas leis que temos, pois assume a responsabilidade não só pelas leis que promulga, mas também pelas leis que se mantêm inalteráveis por via do seu veto às alterações que as tornariam mais perfeitas. Sugere-se, por isso, que sempre que Sua Excelência venha a retomar o tema das más leis da República, se lembre que ele é também responsável por elas (não só através da promulgação, mas também do veto) e que, por tal motivo, fica-lhe bem enfiar, previamente, a carapuça.
ADENDA:
Como seria de esperar a direita (CDS/PP e PSD) congratularam-se com o veto do PR. Ao invés, o Bloco de Esquerda pronuncia-se contra por considerar que o veto é "um passo atrás em termos de fiabilidade do voto". O PS, por seu turno, usando de toda a prudência, limita-se a dizer que, na sequência do veto presidencial, "tem que haver uma ponderação e um reexame".

7 comentários:

Anónimo disse...

Este post denota um reduzido conhecimento da realidade dos portugueses que residem além fronteiras (universo multifacetado que conta 5 milhões de pessoas e vai do emigrantes operário dos anos 60 aos jovens licenciados que procuram oportunidades de emprego que escasseiam em Portugal, tentam internacionalizar a sua carreira ou prosseguem estudos ao nível do doutoramento e pós-doc). Quem fora não viveu, ou viveu somente numa cidade que tem consulado ou embaixado, neglegenciará esta questão, porque não terá sentido nenhuma dificuldade em se deslocar até lá (terá eventualmente perdido meio dia de trabalho para fazer o recenseamento eleitoral, já que os horários destas entidades não costumam ser alargados). Quem vive a uma certa distância das representações consulares portuguesas, se tiver que escolhar entre exercer os seus direitos (tendo que perder 1 dia, para se recensear, e outro para ir votar bem como pagar a deslocação) ou não os exercer, não terá a menor dúvida: não os exerce!
Repare-se que muitos portugueses vivem em Lisboa mas estão recenseados no Norte, Centro ou Sul e tão pouco se deslocam para votar ! De facto, a impossibilidade do voto por correspondência aumenta a abstenção, basta comparar as nossas taxas de participação com dados de países onde tal é possível. Ora, o que seria inteligente por parte do Governo e partidos parlamentares seria de propor o ALARGMENTO DO VOTO POR CORRESPONDENCIA A TODA A POPULAÇÃO PORTUGUESA em vez de tentar dificultar o voto !
São vários os países europeus onde isso é prática corrente e não são poro isso menos democráticos que nós.

Anónimo disse...

Inteiramente de acordo, caro senhor Anónimo.
O presidente Cavaco Silva em quem não votei foi muito bem eleito e, agora é o meu presidente com os votos dos senhores emigrantes.
Não notei nenhum inconveniente nos votos dos emigrantes.
Há políticos demasiado iluninados que descortinam ou lobrigam comportamentos anti-democráticos nesses portugueses estrangeirados, ou possibilidades de manipulação das regras democráticas.

Um português no estrangeiro , querendo, será sempre um português. O pensamento dele é tão genuino como o desse político, nemhum vale mais que um voto per capita, nem um é Abel, nem o outro Caim.
Sampaio Amado

Anónimo disse...

Que é isso de garantir o "voto genuino".
É genuíno o voto no Dr. Santana Lopes? Uns dirão que não é genuíno, como pode alguém esclarecido votar nele? Então , não é verdade que até o astuto e bem informado Pacheco Pereira disse que mudaria de concelho só para não votar nele e para poder dizer ao seu PSD no julgamento final: "éternement fidele, malgré le changement de territoire".

E certas pessoas que a gente vê fracas, doentes e diminuídas a arrastar-se para a mesa de voto, algumas delas onde nem os jornais chegam, estão assim tão esclarecidas que o seu voto também é genuíno?
Para mim é. Não se pode cortar rente sob pena de podermos ser injustos.Isto é como nos tribunais: é melhor absolver um culpado que condenar um inocente!

Anónimo disse...

O veto está a perder credibilidade.
Veta-se pelas razões mais pequenas, até por meras convicções pessoais.A postura de Estado cultiva-se pela grandeza das razões, o que as mais das vezes não acontece. Isto também faz parte da qualidade da democracia
Zé Mário

Francisco Clamote disse...

Expicando e resumindo:
Defende-se aqui o diploma vetado pelo PR pela razão simples de que só o voto presencial assegura a genuinidade do voto, ou seja só por esta forma de votação se assegura que quem exerce o seu direito e o dever de votar é o cidadão inscrito nos cadernos eleitorais.Se esta regra se aplica aos residentes em território nacional (certamente por se entender que assim se acautela a tal genuidade de voto), por que razão é que a mesma regra se não há-de aplicar aos emigrantes? Qual a diferença entre um cidadão residente em Portugal longe do seu local de recensseamento (p.e. um residente no Algarve recenseado em Braga) e um cidadão português residente em Paris e recenseado em Lille ? O actual sistema (voto presencial para os cidadãos residentes em território nacional e voto por correspondência para os emigrantes)trata desigualmente os cidadãos do mesmo país, em desfavor dos residentes. Por que bulas ? Pergunto eu. Os emigrantes têm tratamento preferencial. Porquê ?
E já agora se a regra da votação presencial se aplica também aos emigrantes nas eleições legislativas e nas eleições europeias, qual a razão para a excepção nas legislativas ? A razão só pode ser uma: Tal não convém ao PSD a quem o PR entendeu por bem fazer o frete. Acho eu, que não vejo outra razão. A menos que a lógica seja uma batata, como se costuma dizer.
Cumprimentos a todos.

Anónimo disse...

Agora que vejo este alvoroço e percebo que ninguém está a impedir os emigrantes de votar nas suas embaixadas e postos consulares nos mais diversos países do mundo, também tenho que vir dizer aqui, que não posso concordar com o voto por correspondência nem percebo com alguma vez se lemraram de admitir esta hipótese tão perigosa.
Com milhões de portugueses espalhados pelo mundo e com tanto vigarista político por aí, não me admirava nada que os resultados eleitorais pudessem ser desvirtuados.
Joana

Anónimo disse...

Agora que vejo este alvoroço e percebo que ninguém está a impedir os emigrantes de votar nas suas embaixadas e postos consulares nos mais diversos países do mundo, também tenho que vir dizer aqui, que não posso concordar com o voto por correspondência nem percebo com alguma vez se lemraram de admitir esta hipótese tão perigosa.
Com milhões de portugueses espalhados pelo mundo e com tanto vigarista político por aí, não me admirava nada que os resultados eleitorais pudessem ser desvirtuados.
Joana