"Numa galáxia demasiado perto de si, um novo pacote de austeridade não representa nova austeridade, mas apenas austeridade que, por ter sido (em parte) anunciada numa carta de Passos Coelho à ‘troika' em Maio, não é nova. Denunciar este embuste é, nas palavras do primeiro-ministro, criar um "choque negativo de expectativas" que pode comprometer o sucesso do programa de ajustamento português. Para Passos, não são os cortes nas pensões, nos salários, na saúde, na educação e em tudo o que mexe que são negativos. Negativo, diz-nos, é a reação dos portugueses a mais este pacote de choque e pavor. Passos sente-se injustiçado. Aparentemente, o primeiro-ministro esperava que os portugueses, ufanos, estivessem a celebrar o seu próprio sacrifício.
Todo o discurso sobre o "novo ciclo" resume-se, afinal, ao seguinte: o "novo ciclo" é igual ao anterior, mas em pior. Em pior por duas razões: porque estas medidas vão fazer regressar a espiral recessiva e agravar a situação no mercado de trabalho; e porque, nesta "nova" fase, o governo reforçou o clima de autofagia nacional. Ao invés de mobilizar os seus cidadãos contra uma política que condena o País à servidão, o Governo prefere fomentar um clima de guerra civil: pobres contra remediados, pobres e remediados contra a classe média, trabalhadores contra pensionistas, público contra privado, novos contra velhos, etc. É a luta de classes, mas ao contrário: não constrói laços entre as pessoas, corrói os que existem; não aproxima ninguém, antes explora o ressentimento e a inveja. Aconteça o que acontecer, uma coisa é certa: não se reforça uma comunidade por esta via.
Numa altura em que Comissão Europeia, BCE, FMI, Barroso e fontes anónimas do Eurogrupo chantageiam o Tribunal Constitucional, responsabilizando-o pelo falhanço deste maravilhoso programa de ajustamento, o que se espera de um governo eleito pelos portugueses é que defenda Portugal. Pedir isto não é pedir demais, porque ser um Estado de Direito Democrático não é um luxo; é o que somos, é o que não podemos deixar de ser e, já agora, é (ou era) uma condição necessária para pertencer à União Europeia.
(...)"
(João Galamba; "Eterno retorno do mesmo"; na íntegra: aqui)
1 comentário:
Esta gente mete nojo!
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