quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Culpado? Sim, mas não o principal culpado

"Tem-se formado, ao longo dos últimos dias e à medida que vamos compreendendo os pormenores do desastre orçamental antecipável para 2013, ou ainda conhecendo o desastre da execução orçamental de 2012, tem-se formado, dizia, a convicção de que o culpado de tudo isto é o ministro das Finanças, ou melhor, a sua inflexibilidade, ou o seu dogmatismo ideológico, ou o seu academismo e desconhecimento da economia real.
Respeito quem assim pensa, mas discordo da avaliação.(...)
Um Governo é uma estrutura hierárquica e, quando funciona normalmente, a margem de manobra de que dispõe o ministro das Finanças - ou outros ministros - é aquela que o primeiro-ministro permite ou cria. (...)
A margem de manobra de um Governo é construída pela política de alianças, pela definição da agenda, pelas prioridades escolhidas, pela definição acertada dos interesses a enfrentar, pela comunicação política, pela diplomacia, pela relação com os restantes órgãos de soberania, etc. Em todos estes registos, como se tem comportado Passos Coelho?
O actual Governo chegou ao poder com um apoio político sólido e que, em alguns aspectos, se prolongava na própria oposição de centro-esquerda.
Face a estas circunstâncias excepcionais para enfrentar a crise, que fez Passos Coelho? Alienou completamente o PS. Tratou todo o tipo de alianças com a maior sobranceria e acabou por fazer o mesmo no seio da própria coligação. O actual primeiro-ministro foi também incapaz de se centrar em algumas prioridades para diminuir a despesa do Estado, optando por uma acção política vaga e errática, correctamente percebida como iníqua. A sua comunicação política padeceu exactamente dos mesmos problemas, não porque não saiba comunicar mas porque não se pode comunicar aquilo que não se sabe. Na diplomacia, a estratégia adoptada, de subserviência face aos ditames do Governo alemão, não trouxe vantagens para Portugal, antes pelo contrário. Na relação com o Presidente da República, ou com o poder judicial, o primeiro-ministro foi incapaz de respeitar o regime constitucional de freios e contrapesos, erigindo como inimigos precisamente aqueles que não podia elevar a tal estatuto.
(...)"
(João Cardoso Rosas; "A culpa é do Gaspar?"; na íntegra: aqui) (Negrito meu)

1 comentário:

Graça Sampaio disse...

Ah eu pensava que a culpa tinha sido da "festa socialista" e do Sócrates que daqui a vinte anos ainda há-de ser considerado culpado até pelo terramoto de 1755...